Princípio da legalidade
Alguns dos princípios estruturais
do Direito administrativo, estão presentes na Constituição da República
portuguesa, em concreto no artigo 266º, assim como no código do procedimento
administrativo, nos artigos 3º a 9º. Dos vários princípios mencionados destaca-se
o princípio da legalidade localizado no artigo terceiro do código do
procedimento administrativo, assim como na constituição portuguesa artigo
266º/2.
Dos vários aspetos referentes à
legalidade, importa salientar, a sua evolução na perspectiva do professor Vasco
Pereira da Silva, alguns exemplos de manifestações de legalidade, assim como o
entendimento do professor Marcelo Rebelo de Sousa e André Matos e ainda a
posição de João Caupers e do professor Freitas do Amaral face a este mesmo
princípio.
Primeiramente importa abordar a
forma como o princípio da legalidade evoluiu segundo o professor Vasco Pereira
da Silva. O professor refere várias etapas correspondentes a visões distintas
de legalidade.
Num visão inicial, uma visão
correspondente ao Estado Liberal, o princípio da legalidade funcionava como uma
forma de defesa do particular em face da administração, onde o próprio estaria protegido e seria beneficiário por
esta proteção sempre que administração atuasse dentro daquilo que era definido
pela lei, no entanto esta defesa seria limitada porque a própria
administração era dotada de uma discricionariedade, aproximada de uma arbitrariedade
podendo atuar da forma que entendesse nos aspetos que a lei não regulasse. O que
corresponde a uma ideia de que a administração teria uma reserva de atuação nos
diversos conteúdos que não estivessem previstos pela lei. Na opinião do
professor regente este entendimento não é correto, mas sim o entendimento
moderno de legalidade. O salto evolutivo deste princípio teve como consequência
uma transformação na forma de conceção do mesmo. Atualmente a legalidade encerra
uma abrangência superior indo bastante além da simples subordinação á lei. A
esta é também imposta a subordinação ao direito no seu sentido mais amplo, á
ordem jurídica englobando a vinculação as normas supralegais, constitucionais,
normas de direito europeu, internacionais, infra legais. Desta forma a visão de
lei não corresponde apenas a um documento de natureza legislativa, mas também
ao direito num todo, estando em ligação á constituição, aos tratados europeus e
as convenções internacionais.
Em termos exemplificativos, as manifestações de
legalidade, podem ser o cumprimento de regulamentos, de atos administrativos, o
respeito pelas decisões administrativas, pelo que verificamos uma identificação
no que toca á obediência da administração face as diversas fontes de natureza
jurídica.
Em segundo lugar é relevante fazer referência ao
entendimento do principio da legalidade segundo o professor Marcelo Rebelo de
Sousa e André Matos. De acordo com os mesmos, a legalidade traduz no contexto
do Estado de direito, a subordinação jurídica da administração pública.
Subordinação de onde se evidenciam duas características diferentes, uma que
configura a impossibilidade de administração atuar de forma contraria ao
direito em vigor, a designada preferência de lei e uma segunda característica
que impõem que a atuação mesmo não sendo contraria ao direito, tenha de ser devidamente
fundamentada com base numa norma jurídica, á qual esta reservada a definição
primária das atuações administrativas possíveis, a designada reserva de lei. A
reserva de lei mencionada traduz-se na necessidade de um fundamento jurídico e
normativo, constituindo uma precedência de lei, na qual o fundamento tem de ser
pormenorizado de forma a possibilitar que previsão adequada da atuação
administrativa concebendo assim uma reserva de densificação normativa.
Para
o autor João Couper, a legalidade traduz-se na subordinação da atuação
administrativa ao direito, desta forma os órgãos administrativos só podem agir
com fundamento na lei e sempre limitados pelos limites por ela impostos. As
principais funções asseguradas por este princípio são: assegurar o primado do
poder legislativo sobre o poder administrativo e ainda garantir os direito e
interesses dos particulares. Este primado do poder legislativo tem duas facetas
uma negativa e outra positiva, sendo que a negativa é constituída pela circunstância
de órgãos e os agentes não poderem praticar atos contrários á lei e a positiva
consiste na habilitação legal para os atos, ou seja fica impossibilita a Administração
de atuar fora da área da sua competência, esta faceta é também chamada de precedência
de lei. Segundo este autor, são várias as consequências que podem decorrer da
violação do cumprimento da lei por parte da Administração, entre elas estão a
transformação dos seus atos em atos inválidos, sendo que os atos administrativos
são tidos como atos legais até ao momento em que o tribunal administrativo se
pronuncie sobre eles e constate qualquer tipo de ilegalidade, em razão desta característica
a simples impugnação dos atos não suspende a produção de efeitos do mesmo.
E por último o professor Freitas
do Amaral, que inicia a sua exposição sobre o princípio da legalidade,
começando por identificar, no artigo 226 da constituição o princípio da
prossecução do interesse público, afirmando que a prossecução deste princípio,
teria de obedecer a determinados paramentos, entre os quais o princípio da legalidade e o princípio pelo respeito pelos interesses legalmente protegidos. Os primeiros
parâmetros impõem que a administração obedeça á lei e o segundo impossibilita a
administração de violar a situações jurídica protegidas dos particulares.
Mais especificamente o professor Freitas
do Amaral, entende que o princípio da legalidade deve ser considerado um dos
mais importantes princípios, tendo sido consagrado em primeiro lugar como
principio geral da administração pública, mesmo antes da constituição atual o
mencionar de forma explicita.
O professor explica a forma como
este principio era tradicionalmente definido, exemplificando com a forma como o
professor Marcelo Caetano o entendera “nenhum órgão ou agente da administração
publica tem a faculdade de praticar atos que possam contender com interesses alheios
senão em virtude de uma norma geral anterior”, desta forma proibindo a administração
de lesar os direitos dos particulares, salvo com base na lei.
Faz ainda uma enumeração de
algumas alterações relativamente ao entendimento da legalidade atualmente, que
são as seguintes: este principio passou a ser definido de uma forma positiva, outra
da alterações deve-se ao facto da administração baseada na lei saber aquilo que
deve ou pode fazer e não apenas recorrer á lei para descobrir quais são as matérias
na qual esta proibida de atuar, uma outra transformação deveu-se ao princípio
passar a abarcar todos os conteúdos da atividade administrativa e não apenas as
lesões dos direitos dos particulares e
por ultimo deixou de ser apenas um limite á atuação para passar a ser também um
fundamento da sua ação. Em consequência destas alterações a administração deixa
de se basear no princípio da liberdade para passar a dever obediência ao princípio
da competência.
Destaca ainda relativamente á legalidade
alguns aspetos, o conteúdo, o objeto e as modalidades. Relativamente ao
primeiro aspeto, no âmbito do Estado social de direito, este princípio compreende
não apenas o respeito pela lei, em sentido formal ou material, mas a
subordinação da Administração a um bloco legal, na qual se enquadram a constituição,
a lei ordinária, o regulamento, os direitos resultantes do contrato administrativo
e de direito privado ou do ato, e ainda os princípios gerais de direito, tal
como o direito internacional que vigora na ordem interna. Caso a administração não
cumpra alguns dos aspetos anteriormente referidos, os seus atos terão como consequência
a ilegalidade. Diferentemente no segundo aspeto, englobam-se todos os tipos de comportamentos
da administração, a saber o regulamento, ato administrativo, que tem necessariamente
de respeitar a legalidade, sob pena de ter como consequência a invalidade,
ilicitude ou responsabilidade civil. Quanto ao último aspeto podemos distinguir
essencialmente duas modalidades, a preferência de lei de e a reserva de lei. A primeira
consiste em que nenhum ato de categoria inferior á lei possa contrariar o bloco
de legalidade, sob pena de ilegalidade. Já a reserva de lei, consiste em que
nenhum ato de categoria inferior á lei possa ser praticado sem fundamento no
bloco de legalidade.
Segundo a doutrina existem três exceções
ao princípio da legalidade, contudo o professor Freitas do Amaral discorda que
estas se possam considerar verdadeiramente exceções. A doutrina enuncia três, a
teoria do estado de necessidade, a teoria dos atos políticos e o poder discricionário
da administração. A primeira teoria defende que no caso de estado de necessidade,
como por exemplo em situações de guerra, a administração fica dispensada de
seguir o processo legal estabelecido para as circunstâncias ditas normais, mesmo
que para tal seja necessário sacrificar direitos dos particulares. O professor não
considera este entendimento como uma exceção, visto que o próprio artigo 3/2 do
CP consagra os atos praticados em estado de necessidade. Já segundo, a teoria
dos atos políticos, os atos que correspondem ao exercício da função política, “atos
políticos ou atos do governo”, não sendo suscetíveis de ser alvo de impugnação contenciosa
por parte do tribunal administrativo, poderiam ser atos ilegais. Face a esta teoria
o professor entende que a mesma não é exceção porque o artigo 3/3 da constituição
impõem a obediência dos atos políticos á CRP e é lei, o que não impede de
existirem sanções por via jurisdicional por um tribunal diferente do
administrativo, porque o tribunal administrativo versa sob atos administrativos
e não sobre atos políticos. E por último, o poder discricionário da administração
também não constituiu, uma exceção ao principio da legalidade, mas um modo de
configuração especial da mesma.
REBELO DE SOUSA, Marcelo, SALGADO DE MATOS, André, Direito administrativo Geral, TOMO I,
Dom Quixote.pag.153-170
CAUPERS, João, Introdução ao direito Administrativo, 10ª
edição, ancora editora, sem data. Pag.42-49
Amaral FREITAS, Diogo, Curso
de direito administrativo, Vol.II, 2º edição, 2012 pag.49-63.
Carina Gigante,
subturma 14, nº28123
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