sexta-feira, 7 de abril de 2017

Princípio da legalidade


Alguns dos princípios estruturais do Direito administrativo, estão presentes na Constituição da República portuguesa, em concreto no artigo 266º, assim como no código do procedimento administrativo, nos artigos 3º a 9º. Dos vários princípios mencionados destaca-se o princípio da legalidade localizado no artigo terceiro do código do procedimento administrativo, assim como na constituição portuguesa artigo 266º/2.

Dos vários aspetos referentes à legalidade, importa salientar, a sua evolução na perspectiva do professor Vasco Pereira da Silva, alguns exemplos de manifestações de legalidade, assim como o entendimento do professor Marcelo Rebelo de Sousa e André Matos e ainda a posição de João Caupers e do professor Freitas do Amaral face a este mesmo princípio.

Primeiramente importa abordar a forma como o princípio da legalidade evoluiu segundo o professor Vasco Pereira da Silva. O professor refere várias etapas correspondentes a visões distintas de legalidade.
Num visão inicial, uma visão correspondente ao Estado Liberal, o princípio da legalidade funcionava como uma forma de defesa do particular em face da administração, onde o próprio   estaria protegido e seria beneficiário por esta proteção sempre que administração atuasse dentro daquilo que era definido pela lei, no entanto esta defesa seria limitada porque a própria administração era dotada de uma discricionariedade, aproximada de uma arbitrariedade podendo atuar da forma que entendesse nos aspetos que a lei não regulasse. O que corresponde a uma ideia de que a administração teria uma reserva de atuação nos diversos conteúdos que não estivessem previstos pela lei. Na opinião do professor regente este entendimento não é correto, mas sim o entendimento moderno de legalidade. O salto evolutivo deste princípio teve como consequência uma transformação na forma de conceção do mesmo. Atualmente a legalidade encerra uma abrangência superior indo bastante além da simples subordinação á lei. A esta é também imposta a subordinação ao direito no seu sentido mais amplo, á ordem jurídica englobando a vinculação as normas supralegais, constitucionais, normas de direito europeu, internacionais, infra legais. Desta forma a visão de lei não corresponde apenas a um documento de natureza legislativa, mas também ao direito num todo, estando em ligação á constituição, aos tratados europeus e as convenções internacionais.
Em termos exemplificativos, as manifestações de legalidade, podem ser o cumprimento de regulamentos, de atos administrativos, o respeito pelas decisões administrativas, pelo que verificamos uma identificação no que toca á obediência da administração face as diversas fontes de natureza jurídica.

Em segundo lugar é relevante fazer referência ao entendimento do principio da legalidade segundo o professor Marcelo Rebelo de Sousa e André Matos. De acordo com os mesmos, a legalidade traduz no contexto do Estado de direito, a subordinação jurídica da administração pública. Subordinação de onde se evidenciam duas características diferentes, uma que configura a impossibilidade de administração atuar de forma contraria ao direito em vigor, a designada preferência de lei e uma segunda característica que impõem que a atuação mesmo não sendo contraria ao direito, tenha de ser devidamente fundamentada com base numa norma jurídica, á qual esta reservada a definição primária das atuações administrativas possíveis, a designada reserva de lei. A reserva de lei mencionada traduz-se na necessidade de um fundamento jurídico e normativo, constituindo uma precedência de lei, na qual o fundamento tem de ser pormenorizado de forma a possibilitar que previsão adequada da atuação administrativa concebendo assim uma reserva de densificação normativa.

 Para o autor João Couper, a legalidade traduz-se na subordinação da atuação administrativa ao direito, desta forma os órgãos administrativos só podem agir com fundamento na lei e sempre limitados pelos limites por ela impostos. As principais funções asseguradas por este princípio são: assegurar o primado do poder legislativo sobre o poder administrativo e ainda garantir os direito e interesses dos particulares. Este primado do poder legislativo tem duas facetas uma negativa e outra positiva, sendo que a negativa é constituída pela circunstância de órgãos e os agentes não poderem praticar atos contrários á lei e a positiva consiste na habilitação legal para os atos, ou seja fica impossibilita a Administração de atuar fora da área da sua competência, esta faceta é também chamada de precedência de lei. Segundo este autor, são várias as consequências que podem decorrer da violação do cumprimento da lei por parte da Administração, entre elas estão a transformação dos seus atos em atos inválidos, sendo que os atos administrativos são tidos como atos legais até ao momento em que o tribunal administrativo se pronuncie sobre eles e constate qualquer tipo de ilegalidade, em razão desta característica a simples impugnação dos atos não suspende a produção de efeitos do mesmo.

E por último o professor Freitas do Amaral, que inicia a sua exposição sobre o princípio da legalidade, começando por identificar, no artigo 226 da constituição o princípio da prossecução do interesse público, afirmando que a prossecução deste princípio, teria de obedecer a determinados paramentos, entre os quais o princípio da legalidade e o princípio pelo respeito pelos interesses legalmente protegidos. Os primeiros parâmetros impõem que a administração obedeça á lei e o segundo impossibilita a administração de violar a situações jurídica protegidas dos particulares.
Mais especificamente o professor Freitas do Amaral, entende que o princípio da legalidade deve ser considerado um dos mais importantes princípios, tendo sido consagrado em primeiro lugar como principio geral da administração pública, mesmo antes da constituição atual o mencionar de forma explicita.
O professor explica a forma como este principio era tradicionalmente definido, exemplificando com a forma como o professor Marcelo Caetano o entendera “nenhum órgão ou agente da administração publica tem a faculdade de praticar atos que possam contender com interesses alheios senão em virtude de uma norma geral anterior”, desta forma proibindo a administração de lesar os direitos dos particulares, salvo com base na lei.
Faz ainda uma enumeração de algumas alterações relativamente ao entendimento da legalidade atualmente, que são as seguintes: este principio passou a ser definido de uma forma positiva, outra da alterações deve-se ao facto da administração baseada na lei saber aquilo que deve ou pode fazer e não apenas recorrer á lei para descobrir quais são as matérias na qual esta proibida de atuar, uma outra transformação deveu-se ao princípio passar a abarcar todos os conteúdos da atividade administrativa e não apenas as lesões dos direitos dos particulares  e por ultimo deixou de ser apenas um limite á atuação para passar a ser também um fundamento da sua ação. Em consequência destas alterações a administração deixa de se basear no princípio da liberdade para passar a dever obediência ao princípio da competência.
Destaca ainda relativamente á legalidade alguns aspetos, o conteúdo, o objeto e as modalidades. Relativamente ao primeiro aspeto, no âmbito do Estado social de direito, este princípio compreende não apenas o respeito pela lei, em sentido formal ou material, mas a subordinação da Administração a um bloco legal, na qual se enquadram a constituição, a lei ordinária, o regulamento, os direitos resultantes do contrato administrativo e de direito privado ou do ato, e ainda os princípios gerais de direito, tal como o direito internacional que vigora na ordem interna. Caso a administração não cumpra alguns dos aspetos anteriormente referidos, os seus atos terão como consequência a ilegalidade. Diferentemente no segundo aspeto, englobam-se todos os tipos de comportamentos da administração, a saber o regulamento, ato administrativo, que tem necessariamente de respeitar a legalidade, sob pena de ter como consequência a invalidade, ilicitude ou responsabilidade civil. Quanto ao último aspeto podemos distinguir essencialmente duas modalidades, a preferência de lei de e a reserva de lei. A primeira consiste em que nenhum ato de categoria inferior á lei possa contrariar o bloco de legalidade, sob pena de ilegalidade. Já a reserva de lei, consiste em que nenhum ato de categoria inferior á lei possa ser praticado sem fundamento no bloco de legalidade.
Segundo a doutrina existem três exceções ao princípio da legalidade, contudo o professor Freitas do Amaral discorda que estas se possam considerar verdadeiramente exceções. A doutrina enuncia três, a teoria do estado de necessidade, a teoria dos atos políticos e o poder discricionário da administração. A primeira teoria defende que no caso de estado de necessidade, como por exemplo em situações de guerra, a administração fica dispensada de seguir o processo legal estabelecido para as circunstâncias ditas normais, mesmo que para tal seja necessário sacrificar direitos dos particulares. O professor não considera este entendimento como uma exceção, visto que o próprio artigo 3/2 do CP consagra os atos praticados em estado de necessidade. Já segundo, a teoria dos atos políticos, os atos que correspondem ao exercício da função política, “atos políticos ou atos do governo”, não sendo suscetíveis de ser alvo de impugnação contenciosa por parte do tribunal administrativo, poderiam ser atos ilegais. Face a esta teoria o professor entende que a mesma não é exceção porque o artigo 3/3 da constituição impõem a obediência dos atos políticos á CRP e é lei, o que não impede de existirem sanções por via jurisdicional por um tribunal diferente do administrativo, porque o tribunal administrativo versa sob atos administrativos e não sobre atos políticos. E por último, o poder discricionário da administração também não constituiu, uma exceção ao principio da legalidade, mas um modo de configuração especial da mesma.


REBELO DE SOUSA, Marcelo, SALGADO DE MATOS, André, Direito administrativo Geral, TOMO I, Dom Quixote.pag.153-170

 CAUPERS, João, Introdução ao direito Administrativo, 10ª edição, ancora editora, sem data. Pag.42-49

Amaral FREITAS, Diogo, Curso de direito administrativo, Vol.II, 2º edição, 2012 pag.49-63.



Carina Gigante, subturma 14, nº28123

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