As Garantias constituem os meios
jurídicos de defesa dos particulares contra a Administração Pública. A sua
finalidade consiste na prevenção ou na sanção da violação de direitos ou de
interesses legalmente protegidos dos administrados, provocada por ação ou por
omissão da Administração Pública.
Dentro das garantias dos particulares, destacam-se
as Garantias Administrativas, que se
efetivam através da atuação e da decisão dos órgãos da Administração Pública,
aproveitando as próprias estruturas administrativas e os controlos de mérito e
de legalidade nelas usados.
A classificação tradicional distingue as
garantias administrativas em Petitórias e em Impugnatórias:
Entende-se por Garantias Petitórias, as
garantias que têm por base a existência de um pedido, por parte do particular,
dirigido à Administração Pública e que não pressupõem a prévia prática de um
ato administrativo.
Existem cinco tipos de
garantias de índole petitório:
O direito de petição consiste na
faculdade de solicitar à Administração Pública
providências que se consideram necessárias, como a tomada de decisões, prestação
de informações ou permissão de acesso a arquivos seus ou a processos
pendentes. Ora, com este direito, requer-se à Administração algo que se pretende
obter. Exemplo: art.º 48.º/2 CRP.
O direito de representação consiste na faculdade de pedir a um órgão da
Administração Pública, responsável por uma certa decisão administrativa, a
reponderação ou confirmação desta, tendo em conta as possíveis consequências
negativas que possam advir da sua execução.
Os
funcionários
podem exercer este direito quando estejam perante ordens ilícitas dos seus
superiores hierárquicos ou quando duvidem da autenticidade de tais ordens.
O direito de denúncia consiste na faculdade de o particular
alertar um órgão da Administração Pública para a ocorrência de um certo facto
ou situação que este tenha a obrigação de averiguar. Exemplo: quando se
tem conhecimento de um crime e se faz uma denúncia à Polícia Judiciária ou ao
Ministério Público.
O direito de queixa consiste na faculdade de um particular denunciar o
comportamento de um funcionário/agente da Administração Pública, abrindo-se um
processo de apuramento da responsabilidade disciplinar deste. Este processo
culminará na aplicação de sanções, pois a queixa desencadeia um poder
sancionatório.
De acordo com o Prof. Diogo Freitas do Amaral,
“há uma relação particular entre a queixa
e a denúncia: Toda a queixa é uma denúncia, pois em toda a queixa se faz a
denúncia de certo comportamento de alguém. Mas, nem toda a denúncia é uma
queixa: só há queixa quando ela tem
por objeto o comportamento de uma certa entidade, ao passo que pode haver
denúncias que tenham por objeto outras realidades que não o comportamento de pessoas
singulares ou coletivas”.
O
direito de oposição administrativa consiste na faculdade de contestar decisões que um órgão
da Administração Pública projeta tomar, seja por sua iniciativa, seja dando
satisfação a pedidos que lhe tenham sido dirigidos por outrem.
As Garantias Impugnatórias, por sua vez, constituem
os meios, criados pela ordem jurídica, de que o particular se pode socorrer
para solicitar a revogação, anulação, substituição ou modificação de atos
administrativos já praticados (arts.º 184.º/1 e 2 e 185.º/3 CPA), permitindo
que eles sejam impugnados perante a própria Administração Pública, isto é, sem
recorrer aos tribunais administrativos. Assim, são garantias que consubstanciam
mecanismos de fiscalização da atividade administrativa do Estado, os quais podem
ser usados sempre que sejam postos em causa direitos subjetivos ou interesses
legalmente protegidos dos administrados (art.º 186.º/1 CPA). Contudo, não
poderá reclamar ou recorrer administrativamente quem, sem reserva, tenha
aceitado um ato administrativo depois de praticado (art.º 186.º/2 CPA).
Existem quatro tipos de garantias de natureza
impugnatória, consagradas nos artigos 191.º a 199.º CPA:
A reclamação consiste no direito do
particular que se considere lesado por um certo ato administrativo de solicitar
ao autor do mesmo a sua reapreciação (revogação ou modificação) (art.º 191.º/1
CPA). A reclamação do ato administrativo nunca é uma reclamação necessária,
salvo lei especial. Tem, portanto, um caráter facultativo (art.º 185.º/2 CPA).
Esta garantia encontra fundamento na
possibilidade de os atos administrativos serem revogados ou anulados pelo órgão
que os praticou, pelo que se pressupõe que não haverá uma recusa, por parte de
quem praticou o ato administrativo, de rever e eventualmente proceder à sua
revogação, modificação, anulação ou substituição.
Regra geral, pode reclamar-se de qualquer ato
administrativo, contudo não será possível reclamar de um ato que decida
anterior reclamação ou recurso administrativo, exceto com fundamento em omissão
de pronúncia (art.º 191.º/2 CPA).
O prazo para apresentar a reclamação, salvo
lei especial, é de 15 dias (art.º 191.º/3 CPA), enquanto que o prazo de decisão
sobre a reclamação por parte do órgão competente é de 30 dias (art.º 192.º/2
CPA).
O recurso hierárquico (arts.º 193.º a
198.º CPA), para o Prof. Diogo Freitas do Amaral, é uma garantia administrativa
dos particulares que consiste em requerer ao superior hierárquico de um órgão
subalterno a revogação ou anulação de um ato administrativo ilegal por ele
praticado ou a prática de um ato ilegalmente omitido pelo mesmo.
Pode
ser de legalidade (particular pode alegar como fundamento a ilegalidade
do ato administrativo impugnado ou a ilegalidade da omissão de um ato devido); de
mérito (particular pode alegar como fundamento a inconveniência do ato
impugnado ou da omissão de um ato requerido); ou misto (particular pode
alegar a ilegalidade e a inconveniência do ato impugnado, ou optar por apenas
uma destas, conforme o que for mais satisfatório para os seus direitos ou
interesses legítimos). Regra geral, os recursos hierárquicos são de caráter
misto (art.º 185.º/3 CPA), salvo quando a lei determine o contrário.
Outra classificação distingue os recursos
hierárquicos facultativos e os recursos hierárquicos necessários:
Art.º 185.º CPA - “(…) os recursos são necessários ou
facultativos, conforme depende, ou não, da sua prévia utilização a
possibilidade de acesso aos meios contenciosos de impugnação ou condenação à
prática de ato devido.”
Seguindo a posição do Prof. Diogo Freitas do
Amaral, o recurso hierárquico facultativo (art.º 185.º/2 CPA) “é o
que respeita a um ato verticalmente definitivo, ou à omissão ilegal dele de que
já cabe ação contenciosa”. Já o recurso hierárquico necessário (arts.º
189.º e 190.º CPA) “é aquele que é
indispensável para se atingir um ato verticalmente definitivo que possa ser
impugnado contenciosamente”.
Relativamente à interposição do recurso, este
é “dirigido ao mais elevado superior
hierárquico do autor do ato ou da omissão, salvo se a competência para a
decisão se encontrar delegada ou subdelegada.” (art.º 194.º/1 CPA). Os
prazos do recurso hierárquico estão consagrados nos arts.º 188.º e 198.º/1 e 2
CPA.
O recurso hierárquico impróprio
consiste num recurso administrativo mediante o qual se impugna um ato praticado
por um órgão de uma pessoa coletiva pública perante outro órgão da mesma pessoa coletiva que, não sendo superior
hierárquico do primeiro (isto é, sem que entre eles exista uma relação
hierárquica), exerça sobre ele um poder de supervisão (art.º
199.º/1, alíneas a) e b) CPA).
Este tipo de recurso apenas existe nos casos
expressamente previstos por lei (art.º 199.º/1 CPA).
São aplicáveis ao recurso hierárquico
impróprio, com as necessárias adaptações, as disposições reguladoras do recurso
hierárquico (art.º 199.º/5 CPA).
O recurso tutelar (art.º 199.º/3, 4 e 5
CPA) consiste num recurso administrativo interposto de um ato ou omissão de uma
pessoa coletiva autónoma, perante um órgão de outra pessoa coletiva pública que
exerce sobre ela poderes de superintendência ou de tutela. Assim, para que haja
recurso tutelar, este não só deve estar expressamente previsto na lei (caráter
excecional - art.º 199.º/1 CPA), mas também deve existir uma relação jurídica
de tutela administrativa ou de superintendência.
A este recurso aplicam-se as regras relativas
ao recurso hierárquico, na parte em que não contrariem a natureza própria deste
e o respeito devido à autonomia da entidade que se encontra tutelada (art.º 199.º/5
CPA).
Para terminar, a queixa ao “Provedor de Justiça” consiste
também numa garantia administrativa, consagrada no art.º 23.º da CRP:
“1. Os
cidadãos podem apresentar queixas por
ações ou omissões dos poderes públicos ao Provedor de Justiça, que as
apreciará sem poder decisório, dirigindo
aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar
injustiças.
2. A atividade do Provedor de
Justiça é independente dos meios graciosos e contenciosos previstos na
Constituição e nas leis.
3. O Provedor de Justiça é um
órgão independente, sendo o seu
titular designado pela Assembleia da República, pelo tempo que a lei
determinar.
4. Os órgãos e agentes da
Administração Pública cooperam com o Provedor de Justiça na realização da sua
missão.”
Esta figura não tem poder decisório, pois não
dispõe de competência para revogar ou modificar atos administrativos. Contudo,
tem poderes persuasórios, pelo que estuda o caso concreto e, se entender que o
particular tem razão na queixa, dirige recomendações às autoridades
competentes.
"A
«grande arma» do Provedor de Justiça é a persuasão". – Prof. João Caupers.
Pode também, usando a teoria dos poderes
implícitos, dialogar com as autoridades administrativas postas em causa e
“pressioná-las” a cumprir a lei ou corrigir as suas omissões ou erros.
De acordo com o Prof. Diogo Freitas do Amaral,
o Provedor de Justiça é um órgão da administração central do Estado, com
caráter de órgão independente. Funciona essencialmente como um órgão de
controlo da legalidade administrativa, de caráter gratuito e mais rápido que os
tribunais administrativos.
Sendo uma autoridade independente e
inamovível, goza de grande prestígio e independência que fazem com que, regra
geral, a Administração Pública considere as suas recomendações e as aceite.
A atuação do Provedor de Justiça rege-se por
princípios fundamentais, nomeadamente o informalismo (deve procurar a
verdade e o esclarecimento dos factos através de todos os meios que estejam ao
seu alcance) e o contraditório (não pode censurar ou criticar algum
órgão da Administração Pública, sem que lhe tenha assegurado anteriormente o
direito de esclarecer e fundamentar a sua posição).
Bibliografia:
- AMARAL, Diogo Freitas do. «Curso
de Direito Administrativo», Volume II (3ª edição). Almedina, 2016.
- CAUPERS, João. «Introdução
ao Direito Administrativo” (10ª edição). Âncora editora, 2009.
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