Art.º
9.º CPA – “A Administração Pública deve tratar de forma imparcial aqueles que com
ela entrem em relação,
designadamente, considerando com objetividade todos e apenas os interesses
relevantes no contexto decisório e adotando as soluções organizatórias e
procedimentais indispensáveis à preservação da isenção administrativa e à
confiança nessa isenção”.
Art.º
266.º/2 CRP – “Os órgãos e agentes
administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem atuar, no
exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da
proporcionalidade, da justiça, da
imparcialidade e da boa-fé”.
A imparcialidade (prevista nos artigos 266.º/2
CRP e 9.º CPA) pretende assegurar que a Administração Pública considere e
pondere objetivamente todos os interesses públicos e privados relevantes.
Assim, a Administração Pública, exercendo uma função administrativa, tem a
obrigação de exercer os poderes que lhe foram conferidos com total
objetividade.
Para tal, é necessário que a
sua decisão não se deixe influenciar por considerações de caráter subjetivo,
pelo que se impõe o afastamento dos titulares dos órgãos e agentes da
Administração Pública da resolução de situações suscetíveis de beneficiarem ou
prejudicarem os seus interesses privados enquanto cidadãos. Por outras
palavras, a objetividade administrativa não só pressupõe como impõe a superação
de uma perspetiva subjetivista e parcial do interesse público, devendo a
Administração valorar comparativamente os interesses públicos e privados
afetados com a sua atuação, mas também avaliar todas as consequências que podem
advir do seu comportamento e da realização de um interesse público específico.
De acordo com os Professores Marcelo Rebelo de
Sousa e André Salgado de Matos, o princípio da imparcialidade tem duas dimensões: a
dimensão negativa, proíbe que a
administração considere e pondere interesses que sejam irrelevantes para a
decisão do caso concreto; já a dimensão
positiva impõe que, antes da tomada de decisão, a administração considere e
pondere todos os interesses que sejam relevantes para o caso concreto. Destas
duas dimensões, decorre que, no exercício da sua margem de livre decisão, a
administração tem a obrigação de ponderar e considerar apenas os interesses
públicos e privados importantes para a decisão.
A ordem jurídica preocupa-se em instituir mecanismos
que asseverem que os titulares de órgãos e agentes administrativos não terão
qualquer tipo de influência (de caráter não imparcial) sobre a tomada de
decisão administrativa. Estes mecanismos são, portanto, garantias preventivas
de imparcialidade, consagradas nos artigos 69.º e ss. CPA (impedimentos,
escusas e suspeições).
O Professor Diogo Freitas do Amaral refere
duas vertentes do princípio em análise:
• Vertente negativa – a imparcialidade
consiste na ideia dos agentes e titulares de órgãos administrativos estarem
impedidos de intervir em determinadas situações que digam respeito a interesses
pessoais, de forma a evitar a suspeita da existência de parcialidade de
uma conduta.
Os impedimentos (situações mais graves)
consubstanciam situações de proibição de intervenção (art.º 69.º e ss CPA). Caso se
verifiquem os impedimentos previstos na lei, o agente ou órgão administrativo
deve declarar-se impedido de se pronunciar relativamente à mesma, sendo obrigatoriamente
substituído por uma pessoa imparcial (art.º 72.º/1 CPA). Se, numa decisão
administrativa, participarem agentes ou órgãos administrativos impedidos de o
fazer, a decisão será anulável (art.º 163.º CPA).
As escusas e as suspeições (art.º 73.º e ss
CPA) são situações em que não existe proibição absoluta de intervenção e não se
verificam substituições automaticamente obrigatórias. A escusa
consubstancia uma situação em que é o próprio titular do órgão a abster-se de
intervir, mediante formulação de pedido de dispensa dessa intervenção (art.º
73.º/1 CPA). A suspeição é uma
situação em que a abstenção de intervir é promovida pelo cidadão interessado
nessa não intervenção do órgão, o qual invoca o facto do titular do órgão não
ter condições para ser imparcial (art.º 73.º/2 CPA). Em ambas as situações, o
órgão competente decidirá se há fundamentos justificativos da suspeição.
• Vertente positiva – a imparcialidade
consiste na obrigação da Administração, tanto no processo como na tomada de
decisão, ponderar todos os interesses públicos secundários e interesses privados
relevantes para a tomada de decisão. A inexistência desta reflexão constitui um
vício da decisão.
Terminada a análise deste princípio
constitucional, a imparcialidade consiste, portanto, num meio para a realização
de uma existência de objetividade final da atividade administrativa.
“E não é por acaso que a estátua que costuma
representar a justiça é uma figura humana que tem na mão uma balança com dois
pratos e uma venda nos olhos. Ora, se a balança procura naturalmente
representar a ideia de igualdade, a venda nos olhos procura representar a ideia
de que a justiça deve ser cega, isto é, não deve determinar-se em função da
amizade ou da inimizade para com qualquer das partes”. – Professor Diogo
Freitas do Amaral
Bibliografia:
- AMARAL, Diogo Freitas do. «Curso de Direito Administrativo»,
Volume II (3ª edição). Almedina, 2013.
- CAUPERS, João. «Introdução ao Direito Administrativo” (10ª edição).
Âncora editora, 2009.
- SOUSA, Marcelo Rebelo e MATOS,
André Salgado. «Direito Administrativo Geral - Introdução e Princípios Fundamentais», Tomo I (3ª edição). Dom Quixote,
2008.
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