Sobre o regulamento Administrativo
Este texto
destina-se a fazer um pequeno resumo do sistema de regulamentos administrativos
no Direito português. Não será muito exaustivo e dividir-se-á em três partes:
- Noção de
regulamento administrativo;
- Os tipos
de regulamentos;
- Processo
de elaboração destes.
Sem mais
demoras, avancemos para a primeira parte.
Noção
O
regulamento administrativo, juntamente com o acto administrativo, é um dos dois
processos de actuação preferidos da Administração.
E o que é um
regulamento administrativo, segundo a Doutrina?
Ao contrário
do que é frequente, a Doutrina tem uma posição de concordância no que toca à
noção de regulamento administrativo.
O Professor
Freitas do Amaral define regulamento administrativo como “ as normas jurídicas emanadas no exercício do poder administrativo por
um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal
habilitada por lei.”(1)
João Caupers
tem também um entendimento semelhante:
“ Um regulamento administrativo é um
conjunto de normas jurídicas editadas por uma autoridade administrativa (…) no
exercício do poder administrativo ( ao abrigo de uma faculdade jurídico-pública
atribuída por uma norma legal.” (2)
Mas Freitas
do Amaral vai mais longe, acrescentando à definição acima transcrita, os
seguintes pressupostos dos regulamentos administrativos:
a) O regulamento administrativo é dotado
de duas características fundamentais: a
abstracção e a generalidade das suas
normas. Isto significa que, ao contrário dos actos administrativos ( que
visam situações individuais e concretas), o regulamento é utilizado para
regular um conjunto de situações várias da mesma espécie e destina-se a um
conjunto de pessoas indefinidas, enquanto que o acto destina-se a um indivíduo
ou a um conjunto de indivíduos específicos. (3)
b) O regulamento administrativo
distingue-se da lei ou acto legislativo de três maneiras: primeiro, a lei é
fundada na Constituição, o regulamento tem a sua legitimidade fundada numa lei
de habilitação, como referido no artigo 112, número 7 da Constituição.
Em segundo lugar, uma lei
contrária a uma lei anterior revoga-a tacitamente ou é inválida se for de
hierarquia inferior, um regulamento é automaticamente ilegal se for contrário a
uma lei.
Finalmente, uma lei só
pode ser impugnada nos tribunais se for declarada inconstitucional; um
regulamento pode ser impugnado num tribunal administrativo se se averiguar que
este viola alguma lei ou interesses que estejam legalmente protegidos. (4)
3 – As formas de regulamentos
Na ordem
jurídico-administrativa portuguesa, as formas de regulamento são elencadas
segundo o critério da competência. Por outras palavras, as formas de
regulamento utilizadas diferem dependendo do órgão do qual o regulamento emana.
Comecemos
pelos regulamentos provindos do Governo, que podem ser elencados da seguinte
maneira, segundo Freitas do Amaral (5):
1 – Os
regulamentos do Governo têm o objectivo, segundo o artigo 199 da Constituição,
alínea c), de permitir a boa execução das leis.
Os
regulamentos do Governo podem revestir várias formas, dependendo da sua
proveniência:
a) Decretos regulamentares – os decretos independentes, como
referido no artigo 112, nº6 da CRP, têm de ser editados sob a forma de decretos
regulamentares, para que possa existir um controlo de mérito e de legalidade
destes por parte do Presidente da República, evitando assim uma
discricionariedade administrativa da qual o Governo poderia erroneamente
beneficiar. (6)
b) Resolução do Conselho de Ministros – esta forma de regulamento poderá ser
um regulamento administrativo material, mas poderá também ter conteúdo
diferente de um regulamento. Por exemplo, uma Resolução do Conselho de
Ministros pode ser um acto administrativo concreto.
c) Portaria – é um regulamento administrativo
proveniente de um ou mais Ministros. Não carece da aprovação prévia do Conselho
de Ministros.
d) Despacho normativo – regulamento proveniente de um só
Ministro, sem responsabilidade do Governo.
e) Despacho simples – despacho emanado de um órgão Administrativo
que poderá ser um regulamento, embora teoricamente deva sempre ser, no seu
conteúdo, um acto administrativo. (7)
2 – Regulamentos das Regiões autónomas –
A competência regulamentar das Regiões Autónomas cabe tanto aos Governos
Regionais, tanto ás Assembleias Legislativas.
Os regulamentos das R. A. têm a forma de:
a) Decreto legislativo regional – sob a alçada do artigo 34, nº1 do
Estatuto dos Açores e do artigo 41, nº1, do Estatuto da Madeira, decretos
legislativos regionais são todos aqueles emanados das Assembleias Regionais e
que têm a finalidade de adaptar as leis da República para regulamento. Note-se,
contudo, que Freitas do Amaral manifesta dúvidas sobre a constitucionalidade
desta forma de regulamento.(8)
b) Decreto regulamentar regional – regulamento proveniente do Governo
Regional.
3 – Regulamentos das
autarquias locais:
O artigo 241 da CRP
atribui ás autarquias locais a competência de elaborar regulamentos. Estas
estão obrigadas a invocar a lei na qual se baseia o regulamento municipal.
a) – As Juntas de Freguesia têm o poder de aprovar
regulamentos com eficácia externa e de submeter propostas de regulamentos
internos à respectiva Assembleia de Freguesia, como estipulado no artigo 16,
alínea h) da Lei das Autarquias Locais.
b) – As Assembleias Municipais são competentes para aprovar os
regulamentos municipais de eficácia externa. ( artigo 25, número 1, alínea g)
da Lei das Autarquias Locais.)
c) Ás Câmaras Municipais compete aprovar os regulamentos
internos, como dito no artigo 33, número 1, alínea k) da Lei das Autarquias
Locais.
É importante referir que os órgãos dirigentes de institutos públicos, associações
públicas, assim como empresas do Estado também têm o poder de elaborar
regulamentos com eficácia interna, desde que previamente autorizadas por lei orgânica
ou pelos seus Estatutos. (9)
3 – Processo de elaboração dos regulamentos
O processo de elaboração dos
regulamentos está previsto nos artigos 136 a 138 do Código de Procedimento
Administrativo. Quando editados, os regulamentos devem respeitar as seguintes
disposições:
- No artigo 136 é referido que o
regulamento, para ser legal, necessita de “ lei habilitante”, e deve também
referir-se à respectiva lei
habilitante, ou, no caso do regulamentos independentes, deve referir-se à norma que atribui ao respectivo órgão tal
competência.
- No artigo 137 é dado o prazo de
noventa dias para executar a lei que carece de regulamentação, no caso da norma
nada dizer sobre o prazo. O número 2 do dito artigo dá a possibilidade aos
particulares prejudicados de requerem ao órgão competente a publicação do
regulamento, caso o prazo tenha sido ultrapassado.
- O artigo 138 estabelece a
hierarquia dos regulamentos. Assim, os regulamentos nacionais prevalecem sobre
os municipais, e os regulamentos municipais
prevalecem sobre os regulamentos de freguesia, salvo se os regulamentos
hierarquicamente inferiores configurarem normas especiais.
Sobre a eficácia dos regulamentos
administrativos, estes devem respeitar os artigos 139 a 142 do CPA. Como
acontece com as leis, o artigo 141 do CPA proíbe expressamente a existência de
regulamentos com eficácia retroactiva.
1 – DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de
Direito Administrativo, vol. II, págs 177 a 179.
2 – JOÃO CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, pág. 64
3 - DIOGO
FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito
Administrativo, vol. II, págs 196 a 198
4 – Idem, págs 195 e 196
5 – Idem
ibidem, págs 213 a 220
6 - Idem ibidem, pág. 214
7 - JOÃO CAUPERS, Introdução…,
pág. 68
8 – Ver FREITAS
DO AMARAL, Curso…, pág.216
9 - JOÃO
CAUPERS, Introdução…, pág.69
Ricardo Mendonça
ST 14
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