No Código de Procedimento Administrativo, vem
consagrado, lado a lado com os restantes princípios, no art. 13º, o princípio da decisão. Este princípio
diz-nos que a Administração se encontra vinculada de forma permanente, salvo as
excepções previstas na lei, ao dever de decisão, estando obrigada a dar
resposta a todos os assuntos que lhe forem apresentados e lhe disserem
directamente respeito.
Infelizmente, com o campo teórico e
deontológico do direito positivo verifica-se frequentemente um choque frontal com
o plano prático e ontológico da realidade efectiva. O que, neste caso
particular, significa que nem sempre a Administração Pública de facto responde
a todos os assuntos que lhe dizem respeito e lhe são submetidos.
Surge então a necessidade de solucionar esta
questão. Para tal, e decorrendo do princípio da prossecução do interesse
público (previsto no art. 4º C.P.A.) segundo João Caupers, surgiu a noção de
omissão juridicamente relevante. Para Marcello Caetano dá-se nestes casos uma
presunção legal que constitui um acto, mandando a lei interpretar para a
produção de certos efeitos jurídicos a passividade ou silêncio de um órgão
administrativo como deferimento ou indeferimento do pedido sobre o qual recaia
a obrigação de se pronunciar.
Como pressupostos de que esta passividade ou
silêncio dêm origem a um acto tácito administrativo são identificados:
- a solicitação de pronunciação por parte de
um interessado à Administração num caso concreto;
- o órgão possuir competência para decidir
sobre a matéria em causa;
- o decurso do prazo legal (estabelecido no
art. 128º C.P.A.) sem que haja sido tomada uma decisão expressa;
- a lei ou um regulamento atribuam ao silêncio
um significado jurídico.
Verificando-se esta necessidade de atribuir à
passividade da Administração um significado que pudesse produzir efeitos
jurídicos, tornam-se concebíveis dois sistemas.
O primeiro consistiria na atribuição ao acto
tácito um valor positivo, equivalendo ao deferimento do pedido do interessado, sendo,
portanto um sistema de deferimento tácito. Neste sistema as vantagens são
essencialmente aproveitados pelo interessado, já que verá a sua pretensão
satisfeita em virtude de simples omissão da Administração. No entanto,
verificam-se alguns inconvenientes no que à Administração diz respeito, já que
é um sistema indiferente às razões que geram a omissão, nem todas elas fundadas
em mera negligência, mas podendo antes tratar-se da falta de titular do órgão com
competência para decidir sobre as matérias em causa.
O segundo sistema, que se apelida de sistema
de indeferimento tácito, consiste na vertente que se encontra nos antípodas da
primeira, onde à omissão da Administração corresponde a atribuição de um valor
jurídico negativo equivalendo a um indeferimento do pedido em causa. Este
sistema já é, tendencialmente, mais favorável à Administração pois nunca atribui
à sua passividade ou silêncio consequências que lhe possam ser desfavoráveis.
Já no que aos interessados diz respeito, ainda que o acto tácito venha permitir
o uso de mecanismos de garantia contenciosos (que seriam impossíveis de lançar
mão sobre não havendo essa atribuição de significado jurídico ao silêncio),
acabam por se encontrar numa posição apesar de tudo mais desfavorável face ao
primeiro sistema referido.
Nesta breve descrição dos sistemas, cada um
corresponde contudo a uma vertente absoluta de ambos, podendo, contudo, estes
serem temperados com determinadas disposições e claúsulas que abram excepções
ao princípio subjacente ao sistema seu oposto. Como aliás sempre foi o caso em
Portugal.
No ordenamento jurídico português previamente
à entrada em vigor do primeiro Código de Procedimento Administrativo vigorava o
sistema do indeferimento tácito, pontuado por escassas excepções.
Aquando a elaboração do projecto para o
primeiro C.P.A. pretendeu-se consagrar os dois sistemas em função da matéria em
causa. Contudo, essa opção acabou por não ser a escolhida pelo legislador que
preferiu optar por manter como regra geral o indeferimento tácito, apesar de
sujeito a um maior número de excepções às quais se aplicaria o deferimento
tácito.
Com o Novo Código de Procedimento
Administrativo foram trazidas novas alterações acerca desta matéria. Assim, a
regra geral presente agora no art. 130º passou a ser efectivamente a do
deferimento tácito, mas podendo este verificar-se somente nos casos em que a
lei ou regulamento assim o determine, constituindo esta uma limitação a um
sistema de deferimento tácito puro.
Quando confrontados com a questão da
qualificação do acto tácito de indeferimento em função da sua natureza
jurídica, há na doutrina diversas correntes. Para o Professor Marcello Caetano
o acto tácito seria um verdadeiro acto administrativo, graças à possibilidade
de nele se poder encontrar uma manifestação implicíta da vontade da
Administração, que tendo conhecimento da lei, estaria a par da produção de
efeitos jurídicos que resultariam da sua omissão. Já para o Professor André
Gonçalves Pereira o acto tácito de indeferimento consistiria num simples
pressuposto processual da impugnação contenciosa. O Professor Diogo Freitas do
Amaral opta por uma posição intermédia considerando o acto tácito menos do que
um verdadeiro acto administrativo, mas mais do que um mero pressuposto
processual.
Bibliografia
Diogo
Freitas do AMARAL, Curso de Direito Administrativo, vol. II, 3ª edição 2016
João
CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, 10ª Edição, 2009
Marcello
CAETANO, Manual de Direito Administrativo, vol. I
Miguel Romano, nº 28159
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