sexta-feira, 14 de abril de 2017

Invalidade do ato administrativo: nulidade e anulabilidade


A invalidade do ato administrativo corresponde ao valor jurídico negativo que afeta o ato administrativo em virtude da sua inaptidão intrínseca para a produção dos efeitos jurídicos que devia produzir.
O ato inválido pode ser nulo ou anulável.

NULIDADE

A nulidade é a forma mais grave de invalidade.

O ato nulo é totalmente ineficaz desde o início, nunca chegando a produzir qualquer efeito (artigo 162º/1 CPA). É uma situação de total improdutividade jurídica que não depende de declaração pelos tribunais ou pela administração dessa mesma situação de ineficácia jurídica.

O CPA 91 estabelecia no artigo 137º que a nulidade era insanável, que não podia ser sarada. Não se podia retirar a nulidade a um ato, fosse de que maneira fosse. No novo CPA, no seu artigo 164º/2, consagra-se que os atos nulos podem ser objeto de reforma ou conversão, retirando o caráter de insanabilidade que o caraterizava no antigo CPA.

Os particulares têm o direito de desobedecer a quaisquer ordens que constem de um ato nulo uma vez que este não produz qualquer efeito. Pelo artigo 21º CRP, é conferido aos particulares um direito de resistência passiva à imposição de tais atos.

O ato nulo pode ser impugnado a todo o tempo por qualquer interessado (artigo 162º/2 CPA).

O decurso do tempo é completamente irrelevante, não existem prazos para se invocar a nulidade de um ato administrativo, consequentemente a improdutividade de efeitos jurídicos de um ato nulo é permanente, uma vez ele será sempre nulo passe o tempo que passar.

Há uma possibilidade geral de conhecimento expressa no artigo 162º/2 CPA que nos indica que a nulidade pode ser conhecida a todo o tempo por qualquer autoridade. Qualquer operador jurídico pode recusar a sua eficácia (por exemplo, qualquer tribunal, mesmo que não seja administrativo, pode desaplicar um ato nulo).

A nulidade é declarada, não anulada (o artigo 166º/1/a) CPA diz-nos que os atos nulos não podem ser anulados). Ou seja, sendo o ato nulo, declara-se essa nulidade, não se anula, pois nulo já ele é.

A figura da revogação também não se aplica aos atos nulos (artigo 166º/1/a) CPA), não faria sentido se o fizesse uma vez que se os atos nulos não produzem efeitos e se a revogação visa destruir os efeitos do ato revogados, não há efeitos para serem revogados, não havendo então revogação de um ato nulo. O ato nulo é por sua própria natureza irrevogável.

No CPA 91 os casos de nulidade encontram-se estabelecidos no artigo 133º cujo princípio geral (disposto no nº1) indicava que “são nulos os atos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de validade”.

Os elementos essenciais do ato administrativo considerados eram os seguintes: o autor, o destinatário, a forma, o conteúdo, o objeto e o fim de interesse público.

Todavia, mesmo que o ato se apresentasse munido dos elementos essenciais, se integrasse uma categoria de atos aos quais a lei atribua essa invalidade, o ato seria declarado nulo.

Além dos atos que verificasse a previsão do artigo 133º eram também considerados nulos os atos enumerados no artigo 133º/2.

Com a reforma do CPA, a previsão que constava no artigo 133º/1 foi alterada na redação do artigo 161º/1, passando a ser nulos “(…) os atos para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade.” Quais são então os atos nulos? Os que constam do artigo 161º/2.

Apesar da nova redação do artigo omitir a referência aos atos carecidos de elementos essenciais, o facto é que essa disposição continua presente no nº2 do artigo 161º, que, aliás, mantém em parte a sua redação antiga (correspondente ao artigo 133º/2 CPA 91).

O professor Marcelo Rebelo de Sousa refere ser discutível se os elementos essenciais referidos no então 133º/1 serem não apenas os elementos essenciais gerais dos administrativos (novamente, o autor, o destinatário, a forma, o conteúdo, o objeto e o fim de interesse público), mas também os aspetos essenciais definidores de cada tipo de ato administrativo. Acreditamos que a redação do artigo 161º/2 CPA vai de encontro a essa mesma perspetiva que, como o professor refere, foi aceite pelo Supremo Tribunal Administrativo; uma redação pragmática, simplificada, que concilia num só artigo o que o antigo 133º dispunha em dois. A referência à nulidade de atos que carecem de elementos essenciais continua disposta no artigo, apenas sob uma redação diferente.  

ANULABILIDADE

A anulabilidade é uma sanção menos grave e de caráter geral.

Contrariamente ao que acontece com a nulidade, não existe um elenco geral de situações de anulabilidade.

O artigo 163º/1 CPA representa um critério de identificação dos atos anuláveis que funciona, segundo os professores Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, por exclusão de partes: um ato administrativo ilegal será anulável se não for inexistente, nulo ou irregular, uma vez que nos diz que se tratam de atos “(…) para cuja violação se não preveja outra sanção” (artigo 163º/1 CPA).

O ato anulável é eficaz até ao momento em que venha a ser anulado, produzindo efeitos jurídicos até tal acontecer (artigo 163º/2 CPA), sendo por isso obrigatório enquanto não for anulado, se o vier a ser. E é exatamente por produzir efeitos jurídicos, vinculando e obrigando os seus destinatários, que estes atos, ainda que anuláveis, podem ser executados, ou seja, podem ser impostos pela força (artigo 175º CPA e artigo 176º/1 CPA). Os atos de execução dos atos administrativos anuláveis estão sujeitos a ser retroativamente destruídos em consequência da anulação desses mesmos atos administrativos anuláveis (o ato exequendo).

A Reforma do Código do Procedimento Administrativo introduz um novo artigo, o artigo 168º/1, que vem a estabelecer os prazos para anulação do ato administrativo que seja suscetível de anulação. Podem ser anulados no prazo de 6 meses a contar da data de conhecimento pelo órgão competente da causa da invalidade, ou desde o momento de cessação do erro em caso de erro do agente. Em ambos os casos não podem ter passado mais de 5 anos da data de emissão.

Têm iniciativa para pedir a anulação do ato administrativo os órgãos competentes ou os interessados (artigo 169º/7 CPA) que os podem impugnar perante a própria Administração ou perante o tribunal administrativo competente, nos prazos do artigo 168º/1 CPA (artigo 163º/3 CPA). Posteriormente a Administração poderá anular o ato (artigo 163º/4 CPA).

Todavia, não se esgotam aqui a iniciativa e competência, podendo também os atos ser anulados pelos presentes nos artigos 169º/3 CPA e 169º/4 CPA.

São também anuláveis os atos administrativos praticados por órgão incompetente pelo órgão competente para a sua prática (artigo 169º/6 CPA).

A anulação produz, regra geral, efeitos retroativos (artigo 171º/3 CPA) e repristinatórios (artigo 171º/4 CPA), constituindo a administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido pratico, de cumprir deveres que não tenha cumprido com fundamento naquele ato (artigo 172º/2 CPA) e de indemnizar aqueles que de boa-fé beneficiaram de atos consequentes ao ato anulado desde que praticados há mais de um ano (artigo 172º/3 CPA).

Pode acontecer o mesmo ato cumular tanto nulidade como anulabilidade. Parece claro que se todas as invalidades de que padecer forem geradoras de anulabilidade, o ato é anulável e se forem geradores de nulidade, o ato será nulo. Mas se as invalidades forem fonte tanto de nulidade como de anulabilidade, qual a sanção que prevalecerá? A mais forte, ou seja, a nulidade.

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Bibliografia:
AMARAL, Diogo Freitas do; Curso de Direito Administrativo, vol. II, 2ª edição - 2ª reimpressão, Coimbra, Almedina, 2012;
SOUSA, Marcelo Rebelo de; MATOS, André Salgado de; Direito Administrativo Geral: Atividade Administrativa, Tomo III, 1ª Edição, Lisboa, Publicações D. Quixote, 2007.

Inês Gonçalves nº28251

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