quinta-feira, 27 de outubro de 2016

A Administração Pública e as Funções do Estado



Segundo o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, o Estado constitui a pessoa coletiva mais importante dentro da Administração Pública pelos amplos poderes de direção, de superintendência e de tutela que detém sobre as demais pessoas públicas. Através desta definição, conseguimos perceber que, ao lado do Estado, existem na Administração entidades privadas e públicas com personalidade própria que ladeiam com o Estado. É, no entanto, consensual a importância principal do Estado na prossecução do interesse público. O Estado surge-nos como “o maestro da orquestra que é a Administração Pública em Portugal” como refere o Professor Vasco Pereira da Silva. O Governo tem, na sua função administrativa, o principal centro da atividade central do Estado. É o órgão superior da Administração Pública conforme o artigo 182º da Constituição. Para o Professor Diogo Freitas do Amaral, o Governo, enquanto órgão administrativo, tem três funções principais administrativas: garantir a execução das leis, assegurar o funcionamento da administração pública e promover a satisfação das necessidades coletivas.
Qual o objetivo da administração pública? Para o Professor Paulo Otero, a administração pública, visando sempre a prossecução de interesses públicos, identificados com fins que encontram a sua fonte num título jurídico do poder público, procura satisfazer necessidades coletivas dotadas de projeção ou repercussão política, reconduzíveis ao conceito de bem comum. 

Confrontamos agora a função administrativa com as funções do estado (Função Politica, função legislativa e função jurisdicional). As funções do Estado correspondem a tarefas estaduais ou atividades estaduais, que no quadro do liberalismo entendia-se que deveriam ser atribuídas a órgãos diferentes e a poderes estaduais diferentes (Teoria de Montesquieu da separação de poderes). Atualmente, a separação de poderes já não é entendida com a mesma rigidez, um órgão pode desempenhar várias funções. Por exemplo, o governo desempenha a função política, legislativa e administrativa.
  
1)  Política e Administração pública

O Fim da política é definir o interesse geral da coletividade, já o da administração pública é realizar o interesse geral definido pela política. Quanto ao objeto, o da política são as grandes opções que o país enfrenta ao definir o rumo do seu destino coletivo. No caso do objeto da administração pública, podemos considerar que é a satisfação regular e contínua das necessidades coletivas de segurança, cultura e bem-estar económico e social.
 Quanto á natureza de cada uma, a política tem uma natureza criadora e inovadora em tudo o que seja necessário para conservar e desenvolver a comunidade. A administração pública, contrariamente, possui natureza executiva, cabendo-lhe especialmente colocar em prática as orientações tomadas a nível político. Em relação ao seu caráter, o da política é livre e primário (apenas limitado pelas Constituição em certas áreas), enquanto o da administração pública é condicionado e secundário, estando subordinada às indicações da política e da legislação.  Os órgãos da política são órgãos superiores, ao passo que os da administração são secundários e subalternos, dirigidos e fiscalizados pelos orgãos superiores. Estes órgãos são nomeados, no caso dos órgãos políticos, pelo povo a nível nacional, enquanto os da administração pública são nomeados ou eleitos por colégios eleitorais restritos (à exceção do governo, órgão politico e administrativo). 
Podemos concluir que a administração pública sofre influência direta da política. Além de atividade administrativa, é o desenvolvimento de uma política. No entanto, a distinção nem sempre é clara: o órgão supremo da administração é também político e os atos praticados no exercício de ambas as atividades muitas vezes podem ser confundidos.

2)  Legislação e Administração Pública

Vasco Pereira da Silva liga a função legislativa à político-administrativa. A função legislativa destina-se à tomada das decisões mais importantes no quadro de uma comunidade política e à regulação de forma geral e abstrata dessas decisões. Portanto, aqui o que cabe à função político- legislativa são as grandes opções em termos de organização da sociedade e esta tarefa é materialmente distinta das outras tarefas estaduais.
Para o professor Freitas do Amaral, a função legislativa encontra-se no mesmo plano da política, pois as caraterísticas para distinguir a política da administração pública são as usadas para distinguir entre a administração pública e a legislação. A principal diferença entre a administração pública e a lei é que a primeira está subordinada á segunda. A lei é o fundamento, o critério e o limite de toda a atividade administrativa. Quanto aos pontos de contacto entre ambas podemos considerar que algumas leis contém decisões de caráter administrativo, assim como há atos de administração que revestem todos os caracteres de uma lei, faltando-lhes apenas a sua forma e eficácia. Além disso, por vezes a lei deixa-se completar por atos da administração.

3)  Justiça e Administração pública 
 
Ambas as atividades são secundárias, executivas, subordinadas à lei. Distinguem-se, no entanto, por a primeira consistir em julgar e a segunda em gerir. A justiça aplica o direito aos casos concretos, enquanto a administração pública visa prosseguir interesses gerais da coletividade. A justiça só se pronuncia quando surgem conflitos, a administração pública toma a iniciativa de satisfazer as necessidades coletivas. A justiça não é parte dos conflitos que decide, a administração pública defende e prossegue os interesses a seu cargo, é parte interessada. A justiça é assegurada por tribunais, cujos juízes são independentes e inamovíveis do seu cargo. A administração pública, por sua vez, é exercida por órgãos e agentes hierarquizados.
No entanto, por vezes as suas atividades cruzam-se: administração pública pode praticar atos jurisdicionalizados e os tribunais podem praticar atos administrativos. Há a referir ainda o princípio da submissão da administração pública aos tribunais, para apreciação e fiscalização dos seus atos e comportamentos.

Já relacionadas as funções do Estado com a administração pública, consideramos em forma de conclusão uma definição proposta pelo Professor Freitas do Amaral, que expressa eficazmente esta relação:
A administração pública é a atividade típica dos organismos e indivíduos que, sob a direção ou fiscalização do poder político desempenham em nome da coletividade a tarefa de prover à satisfação regular e contínua das necessidades coletivas de segurança, cultura e bem-estar económico e social, nos termos estabelecidos pela legislação aplicável e sob o controlo dos tribunais competentes.

Bibliografia:
AMARAL, Diogo Freitas do; Curso de Direito Administrativo, vol. I, 4ª edição, Coimbra, 2015
OTERO, Paulo; Manual de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra, 2016
SOUSA, Marcelo Rebelo; MATOS, André Salgado. Direito Administrativo Geral, tomo I, Introdução e princípios fundamentais, 3ºedição, Dom Quixote, 2008

Inês Cantarrilha, nº 28231 

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