Para que as pessoas coletivas possam posseguir os fins que a elas são atribuídos, necessitam de poderes funcionais. Assim sendo, é-lhes atribuída, pela lei, a competência necessária para a prossecução das suas atribuições.
No âmbito da Administração Pública, as normas de competência envolvem sempre o conferir meios ou o configurar de efeitos referentes à intervenção do poder administrativo, procurando visar a definição dos termos de prossecução do interesse público e estabelecendo as condições básicas para a validade das decisões que habilitam. Neste sentido, fora dos poderes que conferem as normas de competência, não existe atuação válida do poder administrativo, nem decisões administrativas consideradas válidas, estando o órgão da Administração, por um lado, limitado pela sua própria competência, e, por outro lado, limitado pelas atribuições (fins ou interesses que a lei incumbe as pessoas coletivas públicas) da pessoa coletiva em cujo nome actua.As atribuições e competências limitam-se reciprocamente, na medida em que nenhum órgão administrativo pode proseguir atribuições da pessoa colectiva a que pertence por meio de competências que não sejam suas, não podendo também exercer a sua competência fora das atribuições da pessoa colectiva em que se integra. Desta forma, para a prossecução de uma única atribuição, existem competências diversas, distribuídas por vários órgãos do município, sendo que as atribuições pertencem à pessoa coletiva e as competências pertencem aos órgãos.
As normas de competência gozam de uma posição hierárquica que faz com estas prevaleçam sempre face a todas as decisões resultantes dos poderes que elas conferem. Isto faz com que a competência seja imodificável, irrenunciável e inalienável, e ainda, não presumível. Quer isto dizer que só há competência quando a lei inequivocamente a confere a um dado órgão, sendo aos particulares impossível a modificação do seu conteúdo ou a sua repartição, bem como lhes é impossível, em caso algum, a pratica de actos pelos quais renunciem aos seus poderes ou os transmitam para outros órgãos da administração ou para entidades privadas. Embora esta última regra não obste a que possa haver hipóteses e transferência do exercício da competência – a delegação de poderes -, nos casos e dentro dos limetes em que a lei o permitir (CPA, art. 46.º).
As normas de competência possuem uma elevada complexidade, de tal forma que se podem distinguir normas que conferem competência, normas que disciplinam o seu exercício e até normas que a regulam. Estas são regras ou princípios que atribuem poderes de intervenção decisória à Administração Pública, que regulam os termos como esses poderes se expressam através da prática de actos jurídicos e atos materiais, sendo também uma espécie de normas sobre normas que têm por objeto disciplinar as próprias normas de competência.
As normas que conferem competência subdividem-se em normas de tarefas ou incumbências públicas, em normas de divisão e separação de funções, em normas de atribuições e, por fim, em normas de competência (em sentido próprio), conforme traçem o recorte das necessidades colectivas a cargo do poder público, procedam à distribuição da satisfação de tais necessidades coletivas pelos diversos poderes do Estado, procedam à distribuição da parcela de interesses públicos a cargo das diferentes pessoas coletivas públicas que a integram de forma a que tais interesses passem a constituir os fins específicos de atuação de cada uma dessas entidades, ou até conforme repartam pelas respetivas estruturas orgânicas as faculdades ou os poderes necessários para se prosseguirem os fins próprios da entidade em que se encontram integradas.
Segundo o princípio da subsidiariedade, a ultrapassagem de um fronteira que separa o público do privado, consubstancia, uma violação da reserva de sociedade civil ou reserva de direitos fundamentais, desde que fora da margem constitucional de liberdade conformada.
Por outro lado, a violação das normas que definem o âmbito material de atuação da função administrativa perante as demais funções do Estado, gera decisões administrativas feridas de usurpação de poderes.
Sendo que a prossecussão de atribuições integrantes da esfera de outra entidade pública, leva a que as decisões administrativas, daí resultantes, se encontrem feridas de incompetência absoluta. Já os casos de incompetência relativa das decisões administrativas, dizem respeito a situações em que um estrutura orgânica age no âmbito dos poderes conferidos a outra estrutura que faça parta da mesma entida pública, sem que para isso esteja habilita.
Atendendo à natureza dos poderes que conferem, as normas de competência em sentido estrito, podem ainda ser classificadas como potetativas ou não consoante confiram, ou não, poderes para a Administração Pública introduzir, unilateral e automaticamente, alterações na ordem jurídica, constituindo, modificando ou extinguindo posições jurídicas.
As normas que disciplinam o exercício da competência procuram fixar os princípios gerais a obedecer no exercício da competência pela Administração Pública e os pressupostos ao exercício da competência, determinar os fins do exercício da competência, estabelecer limites materiais ao exercício da competência ou até prescrever o procedimento e a forma de exercício de tal competência.
A competência das estruturas administrativas, como anteriormente referi, resulta diretamente da lei, da Consituição ou dos princípios gerais de Direito (Princípio da legalidade); sendo que os poderes conferidos não podem ser objeto de renúncia pela estrutura administrativa a quem foram confiados (Princípio da irrenunciabilidade), nem podem ser passíveis de ser objecto de negócio jurídico por parte do seu titular, encontrando-se proibida a sua transmissão a terceiro (Princípio da inalienabilidade). Estes poderes também não se extinguem, nem desaparecem após o seu exercício pelo respetivo titular de raiz (Princípio da inconsumibilidade da competência). E por último, um princípio que reflete o respeito necessário pela delimitação material, territorial, hierárquica e temporal da competência.
As normas que disciplinam o exercício da competência administrativa podem, ainda, dizer respeito ao estabelecimento de requisitos ou cenários na previsão da norma para que a competência possa ser exercida, no entanto, a verificação da ausência de um pressuposto ou a sua violação, na medida em que o decisor age como se não existisse qualquer pressuposto, leva a que exista uma decisão ferida de erro sobre os pressupostos da compentência ou, em alternativa, viciada de incompetência. Em concorrência com os critérios expostos, um acto administrativo praticado por certo órgão da Administração contraas regras eu delimitam a competência dir-se-á ferido de incompetência.
Existirá uma situação de desvios de poder quando se procurar fazer corresponder a motivação principalmente determinante das decisões ao fim que levou a conferir essa competência ao respetivo decisor, no entanto, na realidade, esse motivo principalmente determinante não corresponde ao fim visado pela norma de competência em causa.
No caso de não serem respeitadas as normas que estabelecem limites materiais ao exercício da competência que, consequentemente, impõe condições e requisitos quanto ao objeto da decisão a adotar ao abrigo da competência em causa; estamos perante decidões feridas de violação da lei. Se às normas que prescrevem o procedimento e a forma de exercício da competência, não for prestada a atenção devida, irão ser produzidas decisões feridas de vício de forma.
Quanto às normas que regulam as normas de competência, uma vez que funcionando como um Direito do Direito e sendo, desta forma, passíveis de conferir poderes adicionais à Administração Pública sobre as próprias normas definidoras da sua competência e ainda sobre as normas reguladoras do seu exercício, compreendem: as normas que regulam a produção de normas de competência; as normas que disciplam as relações entre as diversas fontes reveladoras de normas de competência; as normas que resolvem conflitos de normas de competência; as normas que definem critérios de interpretaçõe de competência; e, ainda, as normas que incidem sobre a integração de lacunas de normas de competência.
Porém, na prática da vida administrativa ocorrem, conflitos de atribuições e conflitos de competência. Estes conflitos podem ser positivos ou negativos consoante, dois ou mais órgãos da Administração reivindiquem para si a prossecução da mesma atribuição ou o exercício da mesma competência; ou tais órgãos considerem simultaneamente que lhes faltam as atribuições ou competência para decidir um dado caso concreto. Dir-se-á que existe um conflito de competência quando exisste um disputa acerca da existência ou do exercício de um determinado poder funcional; e conflito de atribuições quando a disputa versa sobre a existência ou a prossecução de um determinado interesse público.
Quando o conflito se reporta ao príncipio da separação de poderes, é costume falar-se em conflito de jurisdição, na medida em que o litígio opõe órgãos administrativos e órgãos judiciais, ou órgãos administrativos e órgãos legislativos.
O CPA veio então trazer os critérios gerais de solução para conflitos e atribuições e conflitos de competências:
• Se envolverem órgãos de pessoas coletivas diferentes, os conflitos são resolvidos pelos tribunais administativos, em processo impugnatório que segue os termos da ação especial (CPA, art. 51.º, n.º1, al. a));
• Se envolverem órgãos de ministérios diferentes, na falta de acordo os conflitos são resolvidos pelo Primeiro-Ministro, porque é a ele que constitucionalmente compete assegurar a coordenação interministerial (CPA, art. 51.º, n.º1, al. b));
• Se envolverem órgãos do mesmo ministério ou pessoas coletivas autónomas sujeitas ao poder de superintendência do mesmo Ministro, na falta de acordo os conflitos são resolvidos pelo respectivo Ministro (CPA, art. 51.º, n.º1, al. c));
• No caso em que os conflitos envolverem órgãos subalternnos integrados na mesma hierarquia, serão resolvidos pelo seu comum superior de menor categoria hierárquica CPA, art. 51.º, n.º 2).
Já a resolução administrativa dos conflitos é feita por acordo entre os órgãos em conflito, ou por decisão do órgão administrativo competente. Esta resolução, pode ser promovida ou por iniciativa de qualquer particular interessado, estando ele a ser prejudicado pelo conflito, ou oficiosamente, quer por iniciativa suscitada pelos órgãos em conflito, quer pelo próprio órgão competente para a decisão, se for infomado do conflito (CPA, art. 52.º).
No primeiro caso, o interessado dirigirá um requerimento fundamentado ao órgao competente para a decisão do procedimento ou do conflito, solicitando-lhe que resolva o conflito; no segundo, um ou ambos os órgãos em conflito deverão fazer um exposição ao órgão competente para a decisão (CPA, art. 52º, n.º1).
O órgão competente para a resolução do conflito deve ainda ouvir, antes de decidir, os órgãos em conflito, se estes ainda não se tiverem pronunciado sobre as razões do conflito; e deve também proferir a sua decisão no prazo de 30 dias (CPA, art. 52.º, n.º2).
Num contexto político e administrativo progressivamente internacionalizado e europeizado, o Professor Paulo Otero entende que as normas que regulam as normas de competência passaram a assumir um particular destaque no relacionamento entre diversas Administrações Públicas situadas em espaços de sobreposição decisória e, por essa via, potencialmente conflituantes, o que leva a que o poder administrativo, bem como os outros poderes internos do Estado, se demonstrem, cada vez menos soberanos.
Bibliografia:
- AMARAL, Diogo Freitas do, "Curso de Direito Administrativo",volume I, 2015, 4° Edição, edições almedina, S.A;
- Otero, Paulo, "Manual de Direito Aministrativo", volume I, Almedina, 2013.
Érica Correia
Nr. 22116
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