Decisão do Ministério das Finanças sobre
o melhor regime jurídico a adotar pela Caixa Geral de Depósitos
Após
uma breve exposição sobre os vários regimes jurídicos possíveis para a Caixa
Geral de Depósitos, debatidos em aula, iremos apresentar a decisão do
Ministério das Finanças.
Entidades
Públicas Empresariais
O carácter público das empresas públicas, nomeadamente
das entidades públicas empresariais, deve-se não só ao facto da maioria de
capital pertencer a entidades públicas ou ao Estado, mas também à eventual
titularidade pelas entidades públicas de «direitos especiais de controlo», que
lhes conferem uma influência dominante sobre as empresas. A influência
dominante encontra-se prevista nos artigos 3º e 9º do RSEE.
As empresas públicas encontram-se sujeitas à
fiscalização e superintendência do Estado – em particular do Ministério das
Finanças e da Inspeção Geral de Finanças. Esta sujeitação consiste numa
vantagem na medida em que há uma maior segurança e proteção dos cidadãos. Mas
consiste também numa desvantagem na medida em que pode conduzir a um
procedimento burocrático excessivo, limitando a eficiência da gerência.
O Estado ou outras entidades públicas possuem a
maioria do capital e, por isso, controlam os órgãos de administração e
fiscalização da empresa.
Sem prejuízo do disposto na legislação aplicável, as
empresas públicas regem-se pelo Direito Privado, com as especificidades
decorrentes do DL nº133/2013, de 3 de outubro, dos diplomas que procedam à sua
criação e constituição e dos respectivos estatutos. Um exemplo da aplicação do
Direito Privado a estas entidades públicas, é utilização do regime jurídico do
contrato individual de trabalho aos trabalhadores destas empresas.
As entidades públicas empresariais são pessoas
colectivas de direito público, de natureza empresarial, criadas pelo Estado
para a prossecução dos seus fins (artigo 56º do RSEE). Deste modo, a CGD
servirá, grosso modo, para responder às necessidades coletivas e ao interesse
público, através do exercício de actividade bancária.
As
orientações estratégicas para as empresas públicas são definidas pelo Governo e
refletem as medidas consideradas relevantes para o equilíbrio económico do
sector empresarial do Estado (artigo 24º, nº1 do RSEE). Contudo, os titulares
dos órgãos de administração gozam de autonomia na definição dos métodos de
gestão a adotar para o desenvolvimento da respectiva actividade (artigo 25º,
nº1 do RSEE).
O
capital das entidades públicas empresariais, o «capital estatutário» é detido
pelo Estado e está destinado a responder às respectivas necessidades
permanentes (artigo 59º do RSEE). Sendo o capital detido pelo Estado, é de
certa forma imposto que o capital de uma EPE seja exclusivamente público. Deste
modo, o caminho para a entrada de capitais privados encontrar-se-á impedido,
bem como a consequente privatização.
As
empresas públicas, e como tal as entidades públicas empresariais, regem-se pelo
princípio da transparência financeira, devendo a sua contabilidade estar
organizada para que seja possível ter acesso a todos os fluxos económicos,
financeiros e operacionais originados, conforme consta do artigo 16º da RSEE. O
que consiste numa aspeto positivo deste tipo de regime jurídico para a Caixa
Geral de Depósitos.
Resposta à privatização
É possível que com a venda das empresas participadas
ou integralmente detidas pelo Governo, se gere receita que permita lidar melhor
com o défice das contas públicas. Pelo que esta seria uma vantagem da opção
pela privatização da Caixa Geral de Depósitos( CGD). Porém, o capital gerado com a
venda e aplicado para reduzir o défice, consideramos ser um investimento a
curto prazo. E apesar de resultar num alívio quanto ao seu custo anual no
orçamento do Estado, não geraria uma quantia muito significativa na medida em
que o estado financeiro em que a CGD se encontra não será assim tão apelativo à
compra por parte de um privado, sendo previsível que o preço que o privado
esteja disposto a pagar seja inferior ao preço pelo qual o Estado está disposto
a vender.
Parece-nos que a imagem da Caixa Geral de Depósitos se
encontra neste momento descredibilizada por todas as polémicas geradas,
nomeadamente com a criação da Comissão de Inquérito. Contudo, a recente
demissão do Presidente António Domingues e, consequentemente de outros três
administradores executivos deixa de ser um razão sustentável indo ao âmago do
motivo para a sua demissão. Não nos devíamos limitar a presumir que a recusa da
declaração dos rendimentos e do património está relacionada única e
exclusivamente ao facto dos administradores terem elevados rendimentos nestes
cargos e que, como tal, vendo este problema de outra perspetiva, aquando da
apresentação da declaração dos rendimentos, se os sujeitos em causa tiverem
negócios com terceiros, estes terceiros passarão a estar também sujeitos a essa
“exposição”. E ainda, a lei foi aprovada depois de António Domingues ter aceite
o cargo e começado a exercer as suas funções enquanto Presidente da CGD. E não
foi nessas condições que o mesmo aceitou o cargo.
A recapitalização da Caixa pode ter mostrado que a
necessidade de regressar aos lucros e competir com os bancos privados é forte
mas como pode a CGD, prosseguir o interesse público sem capital? Mesmo que isso
signifique procurar obter lucro e a rentabilidade. Um banco sem esses dois
vectores não conseguirá prosseguir o interesse público. Nem conseguirá dar
reposta aos objetivos económicos pretendidos.
As empresas públicas acabam por ter sempre como
objectivo o lucro, contudo isto não significa que estas se inibam de procurar
prosseguir simultaneamente o interesse público e responder às necessidades
coletivas.
Após, a reflexão sobre os argumentos apresentados pela
proposta da privatização, passamos a enunciar outros inconvenientes relativos a
este possível modelo.
Primeiro, algumas pequenas e até médias empresas
recorrem ao banco público em detrimento do banco privado, na medida em que os
juros que terão que pagar pelo investimento são inferiores. Se a CGD fosse
privatizada, os juros passariam a ser os mesmos, para que não houvesse
concorrência desleal. O que poderia fazer com que, pela impossibilidade de
suportar os juros exigidos, as pequenas e algumas médias empresas deixassem de
conseguir recorrer aos bancos. O que poderia ter consequências a nível do
desenvolvimento económico. O Estado deve sempre intervir, mesmo que através do
crédito proveniente dos rendimentos dos contribuintes, para tentar manter o
mercado equilibrado.
Segundo,
o facto do banco ser público faz com que não seja necessário recorrer a
sucessivas intervenções do Estado, como aconteceu com o Banco Espirito Santo
que acabou por ir à falência.
Terceiro,
caso a Caixa Geral de Depósitos seja privatizada, o objectivo será torná-la
mais competitiva e eficiente de forma a obter lucro. Contudo, o Estado tem
também interesse em obter o lucro pois só assim conseguirá responder às
necessidades económicas e coletivas. Como tal , o ideal será uma intervenção
conjunto do Estado com um privado, para que se procure maximizar o lucro a par
do interesse público.
É possível que com a venda das empresas participadas
ou integralmente detidas pelo Governo, se gere receita que permita lidar melhor
com o défice das contas públicas. Porém, o capital gerado com a venda e
aplicado para reduzir o défice, consideramos ser um investimento a curto prazo.
E apesar de resultar num alívio quanto ao seu custo anual no orçamento do
Estado, não geraria uma quantia muito significativa na medida em que o estado
financeiro em que a CDG se encontra não será assim tão apelativo à compra por
parte de um privado, sendo previsível que o preço que o privado esteja disposto
a pagar seja inferior ao preço pelo qual o Estado está disposto a vender.
Parece-nos que a imagem da Caixa Geral de Depósitos se
encontra neste momento descredibilizada por todas as polémicas geradas, nomeadamente
com a criação da Comissão de Inquérito. Contudo, a recente demissão do
Presidente António Domingues e, consequentemente de outros três administradores
executivos deixa de ser uma razão sustentável indo ao âmago do motivo para a
sua demissão. Não nos devíamos limitar a presumir que a recusa da declaração
dos rendimentos e do património está relacionada única e exclusivamente ao
facto dos administradores terem elevados rendimentos nestes cargos e que, como
tal, vendo este problema de outra perspetiva, aquando da apresentação da
declaração dos rendimentos, se os sujeitos em causa tiverem negócios com
terceiros, estes terceiros passarão a estar também sujeitos a essa “exposição”.
E ainda, a lei foi aprovada depois de António Domingues ter aceite o cargo e
começado a exercer as suas funções enquanto Presidente da CGD. E não foi nessas
condições que o mesmo aceitou o cargo.
A recapitalização da Caixa pode ter mostrado que a
necessidade de regressar aos lucros e competir com os bancos privados é forte
mas como pode a CGD, prosseguir o interesse público sem capital? Mesmo que isso
signifique procurar obter lucro e a rentabilidade. Um banco sem esses dois
vectores não conseguirá prosseguir o interesse público. Nem conseguirá dar
reposta aos objetivos económicos pretendidos.
As empresas públicas acabam por ter sempre como
objectivo o lucro, contudo isto não significa que estas se inibam de procurar
prosseguir simultaneamente o interesse público e responder às necessidades
coletivas.
Após, a reflexão sobre os argumentos apresentados pela
proposta da privatização, passamos a enunciar outros inconvenientes relativos a
este possível modelo.
Primeiro, algumas pequenas e até médias empresas
recorrem ao banco público em detrimento do banco privado, na medida em que os juros
que terão que pagar pelo investimento são inferiores. Se a CGD fosse
privatizada, os juros passariam a ser os mesmos, para que não houvesse
concorrência desleal. O que poderia fazer com que, pela impossibilidade de
suportar os juros exigidos, as pequenas e algumas médias empresas deixassem de
conseguir recorrer aos bancos. O que poderia ter consequências a nível do
desenvolvimento económico. O Estado deve sempre intervir, mesmo que através do
crédito proveniente dos rendimentos dos contribuintes, para tentar manter o
mercado equilibrado.
Segundo, o facto do banco ser público faz com que não
seja necessário recorrer a sucessivas intervenções do Estado, como aconteceu
com o Banco Espirito Santo que acabou por ir à falência.
Terceiro, caso a Caixa Geral de Depósitos seja
privatizada, o objectivo será torná-la mais competitiva e eficiente de forma a
obter lucro. O que é um aspeto positivo. Contudo, o Estado tem também interesse
em obter o lucro pois só assim conseguirá responder às necessidades económicas
e coletivas. Como tal, o ideal será uma intervenção conjunto do Estado com um
privado, para que se procure maximizar o lucro a par do interesse público.
DECISÃO
E é por isso que a nossa decisão corresponde à
conversão da Caixa Geral de Depósitos, actualmente Sociedade Anónima de
capitais exclusivamente públicos, para uma Sociedade de Capitais Mistos.
O regime de sociedade de capitais mistos
pode ser considerado um ponto de equilíbrio entre o regime de privatização e as
entidades públicas empresariais. Nesse sentido, a Caixa Geral de Depósitos prosseguiria
simultaneamente fins sociais e fins económico-financeiros.
A ideia seria a da captação de fundos
privados para a prossecução de interesses públicos. Desse modo, uma parcela dos
capitais da empresa seria do Estado e a outra de particulares. É nesse sentido
que se afirma que uma sociedade de capitais mistos seria o ponto intermédio
entre uma entidade pública empresarial, cujo capital total é do Estado (capital
público) e uma empresa totalmente privada (capital privado). Com este regime de
sociedade de capitais mistos, o Estado poderia manter o seu poder decisório,
ainda que este pudesse estar limitado às questões mais importantes.
Decorre do artigo 9º, nº 1 do DL nº 133/2013, de 3 de Outubro,
que o Estado, neste regime, teria influência dominante sobre a empresa. Até
porque o Estado seria o accionista maioritário, segundo a proposta defendida
pelos nossos colegas, pelo que deteria 51% da empresa. A Caixa Geral de
Depósitos constituiria uma empresa pública (artigo 5º do D.L) com personalidade
jurídica e autonomia patrimonial, como resulta do disposto no artigo 58º, nº 1
do mesmo Decreto-Lei. Desse modo, a CGD integraria a Administração Indireta do
Estado. Contudo, analisando a questão de uma forma prática, entendemos que esta
relação entre a prossecução do interesse público e a tentativa de maximizar os
lucros é complexa, sendo, por vezes, incompatível.
A maximização do lucro pode, em algumas situações
bloquear a prossecução do interesse público do Estado, ou o Estado pode ser um
impedimento à própria maximização do lucro. Por conseguinte, a relação entre a
prossecução do interesse público e a maximização do lucro é uma relação
complexa e de difícil conjugação.
Para além do exposto, é ainda importante referir que
ao dividir os capitais em públicos e privados, o Estado deixa de obter a
receita total dos lucros da Caixa Geral de Depósitos, assim como deixa de
proceder a escrutínio público, o que pode reproduzir um clima de falta de
transparência.
A privatização parcial da Caixa Geral de Depósitos
traria novos accionistas privados que alargariam, de certa forma, os horizontes
da atividade da instituição. Nesta situação, o Estado continuaria a receber os
dividendos da atividade da CGD, recebendo ainda receitas inerentes a esta
privatização parcial.
Existiria ainda um melhor trade-off entre a prossecução do interesse público pelo Estado e a
maximização de lucros pelos particulares. Por um lado, sendo uma sociedade de
capitais mistos, protegia os cidadãos de uma administração excessivamente
focada na maximização de lucro e por outro, salvaguardava os mesmos cidadãos de
uma má administração baseada em excessiva burocracia e na conjuntura atual, de
supressão de recursos.
DIPLOMA
Resolução da Assembleia da República nº 1/2016
A Assembleia da República
constituiu, ao abrigo do artigo 181º/3, da Constituição, uma comissão
parlamentar de inquérito para o desenvolvimento de iniciativas de reorganização
da Caixa Geral dos Depósitos, em reunião plenária com a seguinte composição:
Grupo
Entidade Pública Empresarial
Grupo
Privatização da Caixa Geral dos Depósitos
Grupo
Sociedade de capitais mistos
Assembleia da República, 9 de
dezembro de 2016 – O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.
Decreto-Lei nº 248/2016, de 15 de Dezembro
A Assembleia da República
decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161º da Constituição por aprovação e
deliberação do Ministério das Finanças, o seguinte regime normativo relativo à
sociedade Caixa Geral dos Depósitos:
Artigo 1º
Natureza e
denominação
1 – A sociedade tem a natureza de
sociedade anónima de capitais públicos e privados, aberta a investimentos,
possuindo a denominação de Caixa Geral dos Depósitos, SA.
Artigo 2º
Personalidade
jurídica
1 – A sociedade é uma empresa pública dotada de personalidade
jurídica, que por sua vez, possui autonomia administrativa, financeira e
patrimonial, segundo o artigo 58º, nº 1, do Decreto-Lei nº 133/2013.
Artigo 3º
Sede
1-A
sociedade tem a sua sede em Lisboa, na Avenida João XXI, 63
Artigo 4º
Capital Social
1 – O capital social é de
5.900.00.00,00 (cinco mil e novecentos milhões de euros) e está subscrito ao
Estado bem como a eventuais acionistas que vejam a sociedade como fonte de
investimento.
2 – A Assembleia Geral deliberará
quanto aos aumentos de capital social e respetiva realização que se tornem
necessários à equilibrada expansão das atividades da sociedade.
Artigo 5º
Representação do
Capital Social
1 – O capital social é
representado por 1.180.000.000 (mil cento e oitenta milhões) ações com o valor nominal
de 5€ (cinco euros) cada uma, no início das negociações, sendo que poderá ser
aumentado dependendo do investimento requerido e da sua respetiva cotação em
bolsa.
2 – As ações representativas do
capital social competem ao Estado como acionista maioritário (a deter 51% da
sociedade), segundo artigo 9º/1 a) do
Decreto-Lei 133/2013; bem como aos investidores privados, a deter 10% a 25% das
quotas a nível nacional e internacional respetivamente.
3 – As ações têm em vista a maximização do lucro a
nível não só estadual, como particular, viabilizando a máxima rentabilização do
capital investido por particulares.
4 – A compra e venda das ações societárias prescinde
necessariamente de autorização do Ministério das Finanças, após emitido parecer
da Inspeção-Geral das Finanças.
5 - A participação do Estado como acionista será
garantida e assegurada pelo membro do Governo responsável pela área de Finanças
(Ministro das Finanças), perante o qual a empresa deverá prestar contas e
apresentar os seus planos de atividade (artigo 39º e seguintes do Decreto-Lei
133/2013).
Artigo 6º
Fiscalização da Administração
1 – A remuneração dos membros competentes da Administração
da sociedade iguala à remuneração de um gestor privado, não prescindindo da
fiscalização dos atos praticados pela sociedade.
2 – A fiscalização a
posteriori, prevista no nº 1 do presente artigo, é realizada pela
Inspeção-Geral das Finanças, não se podendo renunciar à mesma sob pena de
responsabilidade civil e penal.
Aprovado em 15 de Dezembro de 2016.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.
Promulgado em 16 de Dezembro de 2016.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendado em 16 de Dezembro de 2016.
Pelo Primeiro-Ministro, António
Luís Santos da Costa.Elaborado por:
-Ana Clara Graça
-Beatriz Rodrigues
-Diana Gomes
-Felícia Zgardan
-Inês Cardoso
-João Queiroz
-Márcia Santos
-Márcia Santos
-Maria Chim
-Sara Nicolau