quarta-feira, 30 de novembro de 2016

A Relação entre a Tutela e Superintendência do Estado

   O conceito de tutela administrativa diz respeito, de acordo com o Professor Diogo Freitas do Amaral, ao conjunto de poderes de intervenção de uma pessoa coletiva pública na gestão de outra pessoa coletiva, a fim de assegurar a legalidade ou o mérito na sua atuação.[1]
   A tutela administrativa pressupõe a existências de duas pessoas coletivas distintas- a tutelar e a tutelada. Entre estas duas pessoas coletivas a primeira é necessariamente pública, a segunda é, na maior parte dos casos, também[2].
   Os poderes desta tutela são de intervenção na gestão da pessoa tutelada, sendo por isso, o fim da tutela administrativa o assegurar, em nome da entidade tutelar, que a entidade tutelada cumpre as leis em vigor e garantir que são selecionadas soluções convenientes para a prossecução do interesse público.
   A tutela administrativa tem apenas lugar entre duas pessoas jurídicas diferentes e autónomas.
  Estes poderes tutelares substituem a hierarquia onde ela não só não existe, como não pode existir, ora hierarquia indica a subordinação de uns órgãos a outros, por outro lado, a autonomia pressupõe a competência de um órgão para decidir sem receber ordens nem ficar dependente de qualquer outro. Marcello Caetano releva a tendência centrifuga destes órgãos autónomos e como esta oferece perigo de descoordenação de esforços e da multiplicação de atividades com o mesmo objeto – daí a instituição pela lei de formas de fiscalização, correção e coordenação dessas entidades por outras.  
   Podem ser encontradas várias distinções[3] entre as formas que a tutela administrativa pode assumir no nosso Direito, seguiremos a apresentada pelos Professores Marcello Caetano e Sérvulo Correia, que difere entre tutela corretiva, tutela inspetiva e substitutiva.
   Em relação à primeira podemos dizer que pretende corrigir os inconvenientes que possam resultar do conteúdo dos atos projetados, ou já decidimos pelos órgãos tutelados – assim sendo, a lei exige que se o ato ainda se encontrar em projeto seja submetido à autorização da pessoa coletiva tutelar, aquilo a que chamamos tutela a priori, e é declarada a invalidade do ato praticado sem ela. É também possível referir a tutela a posteriori que se baseia na aprovação – expressa ou tácita – exercida sobre um ato já praticado, no entanto, este só se torna executório graças a ela.
   Já a tutela inspetiva, de acordo o Professor Marcello Caetano, consiste no poder de fiscalizar os órgãos e os serviços da pessoa coletiva para o efeito de promover a aplicação de sanções contra as ilegalidades ou a má gestão o que se resume à tutela exercida sobre as autarquias locais[4].
A tutela inspetiva, no que diz respeito às autarquias é apenas de legalidade – art. 91º/2 da Lei das Autarquias Locais – não chega ao exercício oficioso de um poder de revogação.
   Por fim, a tutela substitutiva que consiste no poder da autoridade de tutela de suprir as omissões do órgão tutelado e, no lugar deste praticar os atos que, contra expressa imposição legal, não hajam sido produzidos na ocasião determinada.
   Importa também referir as linhas gerais do regime jurídico da tutela administrativa:
      - Ela não se presume (só existe quando e nos termos em que a lei especificamente a estabelecer);
      - Sobre as autarquias locais há uma mera tutela de legalidade;
     - Os órgãos autárquicos podem consultar o Governo sobre dúvidas de interpretação de diplomas legais, mas as respostas são meros pareceres, de carácter não vinculativo;
     - A entidade tutelada tem legitimidade para impugnar administrativa e contenciosamente os atos pelos quais a entidade tutelada exerça os seus poderes de tutela.
   No que diz respeito à superintendência, o professor João Caupers, como a relação entre duas pessoas coletivas que confere aos órgãos de uma delas os poderes de definir os objetivos e orientar a atuação dos órgãos da outra.
   Esta relação estabelece-se quando uma das pessoas coletivas envolvidas se encontra, em alguma medida, da dependência da outra[5].
   As diretivas e as recomendações são os instrumentos típicos da superintendência. São-no, uma vez que, são aquelas que impõem as metas a atingir, mas, não obstante, mantêm a liberdade quanto aos meios para o fazer. Caupers chama-lhes opiniões acompanhadas de um convite para agir num certo sentido.

Os institutos e empresas públicos, por estarem sujeitos a superintendência (por exercerem administrativa indirecta por devolução de poderes), não deixam por isso de estar sujeitos a tutela administrativa.
Duas pessoas coletivas podem estar simultaneamente ligadas por relações de superintendência e tutela. Esta ocorrência pode dar-se em relação às entidades que compõem a administração instrumental do Estado[6].
Olhando a nossa Constituição de 1982, temos no art. 202.º a base jurídica da distinção entre tutela administrativa e superintendência – ao Governo cabe a responsabilidade da superintendência da administração indireta do estado, possuindo designadamente o poder de orientação.
A superintendência é um poder mais forte do que a tutela administrativa (porque define a orientação da conduta alheia, enquanto esta apenas controla a sua regularidade ou adequação; aquela orienta, esta controla), e menos forte que o poder de direção (este é típico da hierarquia e consiste na faculdade do superior dar ordens ou instruções, enquanto a superintendência é apenas uma faculdade de emitir diretivas ou recomendações).


  Ana Clara Graça, 26683

Bibliografia
Caetano, Marcello – Manual de Direito Administrativo Vol. I, 10ª Edição, Lisboa, 1973
Correia, J. M. Sérvulo – Noções de Direito Administrativo Vol. I, Danúbio 1982
Caetano, Marcello – Princípios fundamentais do Direito Administrativo, Almedina 1996  
AMARAL, Diogo Freitas do – Curso de Direito Administrativo Vol. I, 2ª Edição, Almedina 2001
Caupers, João – Introdução ao Direito Administrativo, 9ª Edição, Lisboa


[1] Marcello Caetano contrapõe esta realidade com a de alguns dos países sul americanos em que se utiliza a expressão contralor que engloba todas a formas de fiscalização da legalidade e da regularidade da atividade Administrativa- a exercida por órgãos legislativos, executivos ou judiciais e inclui também a do Tribunal de Contas.
[2] O Professor Freitas do Amaral lembra que não deveria ser aceite o exercício de poderes sobre pessoas coletivas privadas, no entanto, há leis que o impõem e a nossa Constituição permite-o.
[3] Freitas do Amaral distingue cinco formas distintivas: a tutela integrativa; a tutela inspetiva; a tutela sancionatória; a tutela revogatória e a tutela substitutiva in Curso de Direito Administrativo Vol. I, 2ª Edição – p. 702-706
[4] No Continente compete ao Governo da República e nas Regiões Autónomas aos Governos Regionais – art. 243º/1 CRP. À luz do art. 91º da LAL (Lei n.º 169/99, de 18 de setembro) tutela do Governo é exercida pelo governador civil e superintendida pelos Ministérios da Administração Interna e das Finanças.
[5] Na maioria dos casos foi a segunda que criou a primeira.
[6] No entanto, se nos referirmos às entidades que integram a administração autónoma (autarquias locais) apenas têm com o Estado uma relação de tutela.

Evolução Histórica das Empresas públicas

Evolução Histórica das Empresas públicas

No presente texto pretendo demonstrar um pouco sobre a evolução histórica das empresas públicas em Portugal, inicio a minha exposição enunciando os 3 períodos que nos permitem perceber o porquê e de que modo as empresas públicas foram evoluindo no panorama Nacional.
O primeiro período será o que antecede o 25 de Abril de 1974, até esta data as empresas públicas eram poucas e existiam já do passado setecentista, sendo que algumas delas foram criadas por transformação de velhos serviços públicos tradicionais, para obter ganhos de eficiência e produtividade.

A 25 de Abril de 1974, dá-se início ao segundo período, e é com a revolução que muitas empresas privadas foram nacionalizadas e se converteram em públicas. No entanto foram vários os motivos que levam a uma modificação por completo, tais como, a entrada de Portugal na CEE[1], a aplicação na ordem interna de diretivas comunitárias e dos mecanismos de defesa da concorrência. É portanto, neste período que o estatuto jurídico das empresas passa a constar do Decreto-lei nº260/76, de 8 de Abril. O presente decreto trás ao quadro legislativo nacional, pela primeira fez, a figura das empresas públicas e continha ainda as bases gerais do regime das empresas públicas, anteriormente não existia nenhum diploma genérico regulador do estatuto das empresas públicas. Este diploma surge numa fase em que a sociedade portuguesa se encontra numa transição para o socialismo e num contexto em que as empresas públicas representavam um papel importante uma vez que, detinham posições exclusivas ou dominantes em sectores básicos da economia. Este diploma teve a duração de cerca de 25 anos. A revogação deste mesmo decreto e a sua substituição pelo Decreto-Lei nº 558/99, de 17 de Dezembro, dá início ao terceiro período que tem início em 1999 e vem até aos dias de hoje. Este último decreto enuncia no seu preâmbulo:

Na sequência das profundas alterações verificadas na composição e nas regras de funcionamento do sector empresarial do Estado ao longo dos últimos anos, procura-se com o presente diploma estabelecer um regime quadro aplicável às entidades que, hoje em dia, mais caracteristicamente integram tal sector… As soluções que agora se consagram são ditadas pela preocupação de criar um regime muito flexível, suscetível de poder abranger as diversas entidades que integram o sector empresarial do Estado e que deixaram de estar submetidas à disciplina do Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril (lei de bases das empresas públicas), passando a atuar de harmonia com as regras normais do direito societário”.







Este diploma foi criado uma vez que o anterior já não satisfazia as necessidades do sector empresarial do estado, visto que este tinha sofrido inúmeras e profundas alterações, e também porque numa fase final de vigência, já só se aplicava a um número muito reduzido de empresas. Este decreto acaba também por ser revogado pelo Decreto-Lei nº133/2013, de 3 de Outubro.
A diferença fundamental entre este diploma e o diploma de 1976, é a que este último só se ocupava de uma espécie de empresas públicas. [2] Já o diploma de 2013 e também o seu antecessor de 1999, visavam regular genericamente o sector público empresarial e este distingue ainda três espécies de empresas que dele fazem parte, as empresas públicas sob forma privada, que são sociedades controladas pelo estado, as empresas públicas sob forma pública, também chamadas de entidades públicas empresariais, e por fim as empresas privadas participadas pelo Estado que são empresas públicas, mas que integram o sector empresarial do estado.
Este decreto de 2013, não significou uma rutura com o Decreto-lei nº 558/99, uma vez que se manteve a distinção entre duas categorias de empresas públicas. No entanto este novo diploma trouxe um reforço dos poderes de intervenção do governo na gestão financeira das empresas, principalmente do ministro das finanças, isto acontece tendo como objetivo controlar o problema do forte endividamento de empresas públicas que ameaçavam não só a sua visibilidade económica, como também o cumprimento dos objetivos do estado em matéria de défice orçamental e de divida pública.
Esta breve exposição permite-nos ter uma ideia da evolução das empresas públicas no direito português, no entanto penso ser ainda necessário referir o conceito de empresas públicas. Infelizmente o direito português não ajuda à elaboração deste conceito. O decreto-lei nº 133/2013, que não apresenta um conceito unitário, ficando pela definição de duas espécies principais de empresas públicas, mas permite no entanto retirar deste diploma elementos que permitam a elaboração de um conceito de empresa pública. Sendo eles:
- A forma jurídica da empresa pública é irrelevante para a definição do respetivo conceito, uma vez que há empresas públicas sob a forma de pessoas coletivas públicas, e há empresas públicas que não são sociedades comerciais, que constituem pessoas coletivas privadas.
- As empresas públicas sob forma pública têm direção e capitais públicos.
- As empresas públicas sob forma privada caracterizam-se pela sua subordinação à “Influência dominante” do Estado, a qual pode resultar da “maioria do capital” da “maioria dos direitos de voto”, do direito de “dedignar ou destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização”, bem como da disposição de “participações qualificadas ou de direitos especiais que permitam influenciar de forma determinante os processos decisórios ou as opções estratégicas da empresa”.[3] (D.L. nº 133/2013, art.9º, nº1).[4]
Concluindo, de tudo isto parece resultar que existem dois elementos que permitem determinar o conceito de empresa pública, isto de acordo com a lei portuguesa atual. Primeiro a empresa pública é uma empresa em sentido económico, e em segundo o seu carácter público não lhe advém apenas do facto de a maioria do capital pertencer a entidades públicas, mas pode resultar em alternativa da titularidade por tais entidades de direitos especiais de controlo que lhes deem sobre a empresa uma influência dominante.
Para Diogo Freitas do Amaral, as empresas públicas seriam “organizações económicas de fins lucrativos, criadas e controladas por entidades jurídicas públicas”.[5]
Por último exponho ainda a questão de saber qual a missão das empresas públicas. De acordo com o D.L nº 558/99 a missão das empresas públicas encontrava-se legalmente definida:
Artigo 4.º
Missão das empresas públicas e do sector empresarial do Estado
 

A atividade do sector empresarial do Estado deve orientar-se no sentido da obtenção de níveis adequados de satisfação das necessidades da coletividade, bem como desenvolver-se segundo parâmetros exigentes de qualidade, economia, eficiência e eficácia, contribuindo igualmente para o equilíbrio económico e financeiro do conjunto do sector público.”

No entanto no diploma de 2013 não se encontra norma análoga, mas “ o princípio da dupla missão das empresas públicas mantém-se plenamente válido. Com efeito, atendendo, por um lado, à natureza empresarial destas organizações, e por outro lado à sua integração no âmbito da administração estadual indireta, resulta clara a sua dupla missão”
Missão esta que se divide em missão económica financeira, uma vez que as empresas públicas tem como objetivo contribuir para o equilíbrio económico-financeiro [6] do sector público, e na missão social, ou seja de obtenção de níveis adequados de satisfação das necessidades coletivos.

Carolina Rosa nº28239



[1] Comunidade Económica Europeia
[2] (que até à data seriam as únicas que se revelavam importantes, que seriam as empresas públicas sob forma pública, ou seja, as que eram juridicamente institutos públicos);
[3] Expressões retiradas do livro de Amaral, Diogo Freitas do, “Curso de Direito Administrativo”, volume I, 2015, 4º Edição , edições almedina, S.A;
[4] “Artigo 9.º Influência dominante

1 - Existe influência dominante sempre que as entidades públicas referidas nos artigos 3.º e 5.º se encontrem, relativamente às empresas ou entidades por si detidas, constituídas ou criadas, em qualquer uma das situações seguintes:
a) Detenham uma participação superior à maioria do capital;
b) Disponham da maioria dos direitos de voto;
c) Tenham a possibilidade de designar ou destituir a maioria dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização;
d) Disponham de participações qualificadas ou direitos especiais que lhe permitam influenciar de forma determinante os processos decisórios ou as opções estratégicas adotadas pela empresa ou entidade participada. “

[5] Encontramos uma definição diferente no Prof. Doutor Jorge Manuel Coutinho de Abreu;

[6] Encontramos este princípio no art.24º nº1 do estatuto atual, nos termos do qual o governo aprova as orientações estratégicas para as empresas públicas, tendo em vista o equilíbrio económico e financeiro do sector empresarial do Estado.





  • Amaral, Diogo Freitas do, “Curso de Direito Administrativo”, volume I, 2015, 4º Edição, edições almedina, S.A;
  • http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=1992&tabela=leis;
  • Otero, Paulo “Manual de Direito Administrativo”, volume I, edições almedina, S.A;
  • http://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=591&tabela=leis;

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

O poder de superintendência


O poder de superintendência é o poder que é conferido ao Estado ou a outra pessoa coletiva pública de fins múltiplos, de definir os objetivos e de guiar a atuação das pessoas coletivas públicas de fins singulares, colocadas por lei na sua dependência.

O conceito de “devolução de poderes” permitir-nos-á entender melhor a razão de ser deste poder. A “devolução de poderes” consiste no sistema em que os interesses públicos do Estado ou de pessoas coletivas de população e território, são atribuídos a outras pessoas coletivas públicas de fins singulares, através da lei. Verifica-se um movimento de transferência de atribuições do Estado para outra entidade, permitindo que toda a administração pública funcione de forma mais eficiente. Nas palavras do professor Freitas do Amaral, “descongestiona-se” a gestão da pessoa coletiva principal: o Estado. O que vai permitir, igualmente, a concretização do princípio da desburocratização, na medida em que se pauta pela organização da administração pública, de forma a funcionar em termos mais eficientes e céleres, prosseguindo os interesses públicos e facilitando a vida dos particulares.

Os poderes transferidos são exercidos no interesse da pessoa coletiva que os transferiu, e sob orientação dos seus órgãos, mas em nome das pessoas coletivas criadas para o efeito.

As pessoas coletivas às quais são “devolvidos” os poderes, os denominados “entes instrumentais ou auxiliares”, podem dispor de alguma autonomia administrativa. Podem dispor de autonomia financeira, embora não exerçam auto-administração. Esta auto-administração está presente nas autarquias locais, que pertencem à administração autónoma, mas encontra-se ausente nas entidades incumbidas de administração indireta.
Por exemplo, as autarquias locais, como pessoas coletivas independentes e pertencentes à administração autónoma do Estado, têm o direito de elaborar e aprovar, sem interferência do Estado, o respetivo orçamento anual. Porém, na administração indireta, como acontece com os institutos públicos e as empresas públicas, o orçamento é elaborado por estas entidades, mas encontra-se sujeito à aprovação pelo governo.

Quem define a orientação geral da atividade dessas entidades é o Estado ou as pessoas colectivas de fins múltiplos que lhes deram origem. Esta orientação geral vai refletir-se no já referido poder de superintendência.

De acordo com o artigo 199º, aliena d) da Constituição da República Portuguesa, é da competência do Governo, no exercício da função administrativa, superintender na administração indireta. A lei prevê uma relação de superintendência estabelecida entre duas pessoas coletivas públicas, sendo uma delas o Governo, conferindo aos seus órgãos, os poderes de definir os objectivos e orientar a atuação dos órgãos das pessoas coletivas pertencentes à administração indireta.

Este poder de orientação do Governo é possível entender-se recorrendo a uma citação de Sabino Cassese, utilizada pelo professor Vasco Pereira da Silva. O professor italiano afirma que a função do Governo, no âmbito do direito administrativo, é uma função semelhante à de um chefe de orquestra, que faz com que as diferentes entidades e os diferentes órgãos toquem, no momento certo, a música que está na partitura. A posição do chefe de orquestra é a posição de coordenação, fazendo com que o que está na partitura seja executado de forma correta e adequada, guiando a atuação de todos. O que se pretende verificar aquando o exercício do poder de superintendência.

O poder de orientação tem como instrumentos típicos as diretivas e as recomendações. A diretiva é o ato administrativo que vincula o destinatário à concretização de determinados objetivos, deixando-lhe liberdade quanto à escolha dos meios para os alcançar. A recomendação corresponde a um ato opinativo, acompanhado de um convite a agir num determinado sentido.

Duas pessoas colectivas públicas podem encontrar-se simultaneamente ligadas por relações de superintendência e de tutela. Isto ocorre com as entidades que compõem a administração instrumental do Estado. Estas entidades podem integrar a administração autónoma, nomeadamente as autarquias locais, que somente têm com o Estado uma relação de tutela. O que também se retira do artigo 199º, alínea d), da CRP.

A relação de tutela administrativa entre duas pessoas coletivas públicas, determina que os atos praticados pelos órgãos da pessoa coletiva tutelada se encontram sujeitos à interferência de um órgão da entidade tutelar, com o propósito de assegurar a legalidade ou o mérito das suas condutas.

Os institutos públicos, que pertencem à administração indireta do Estado, estão sujeitos a poderes de superintendência, previstos no artigo 42º da Lei Quadro dos Institutos Públicos, bem como a poderes de tutela, que se retiram do nº1 do artigo 41º da presente lei. O mesmo sucede com as empresas públicas do Estado, como é possível verificar nos artigos 24º, nº1 e 25º, nº5 do Regime Jurídico do Setor Público Empresarial.




Bibliografia:

AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, volume I, 3ª edição, 2006

CAUPERS, João, Introdução ao Direito Administrativo, 10ª edição. 2009

SOUSA, Marcelo Rebelo de, MATOS, André Salgado de, Direito Administrativo Geral, tomo III Atividade administrativa, reimpressão da 2ª edição, 2010

A administração estadual indireta


São variados os fins do Estado e as atribuições que estão a seu cargo. Numerosas e complexas, as funções do Estado estão em constante alargamento, e são estas suas caraterísticas que permitem a existência do que podemos chamar administração estadual indireta. Dada a multiplicidade das funções do Estado, a forma mais vantajosa de realizar os seus fins (principalmente os fins ligados a funções de caráter social, cultural e económico) será de forma indireta, contrariando assim a regra geral de que os fins do Estado são prosseguidos pela pessoa coletiva que é o Estado (forma direta) e sob a direção do Governo que se encontra hierarquicamente na sua dependência (forma imediata).
Podemos afirmar que estamos perante uma administração central descentralizada. Existem, dentro do Estado, serviços com órgãos próprios de direção e gestão, providos de autonomia no desempenho das suas funções.
Também é verdade que existe ainda um grupo de serviços criados pelo Estado, dotados de maior grau de autonomia, e são esses mesmos serviços que formam a administração estadual indireta. Ao serem providos de personalidade jurídica, estes serviços tornam-se distintos da pessoa coletiva do Estado. Apesar de ainda estar em causa a prossecução de fins e atribuições do Estado (como previamente dito) essa prossecução é feita por outras pessoas coletivas que não o Estado. O Estado realiza indiretamente os seus fins ao confiar a realização dos mesmos a estas entidades.
Estão aqui presentes o aspeto material e o aspeto orgânico da administração estadual indireta.
O primeiro, ao dizermos que esta forma de administração consiste na transferência por parte do Estado da atividade de realizar os seus fins para outras entidades distintas dele. Em Direito Administrativo a essa transferência chama-se devolução de poderes. Esses poderes entregues a outras entidades continuam a ser poderes do próprio Estado, podendo este, portanto, chamar os poderes de novo a si. O Estado continua a ter poder de intervir nessas entidades, podendo nomear e demitir dirigentes e dar diretivas sobre como exercer a sua atividade, fiscalizando-a e controlando-a.
O segundo, ao admitirmos que a administração indireta do Estado se trata de um conjunto de entidades públicas distintas com personalidade jurídica própria, cuja criação cabe livremente ao Estado. Apesar de poderem ter autonomia financeira, o seu financiamento cabe também ao Estado em todo (caso em que falamos só de autonomia administrativa) ou em parte (caso em que falamos de autonomia administrativa e financeira). O capital necessário para o arranque da iniciativa é avançado pelo Estado assim como o são as indemnizações compensatórias, quando as receitas cobradas na atividade não são suficientes para cobrir as despesas.

Que órgãos são estes que temos vindo a referir? Tratam-se fundamentalmente dos institutos públicos e das empresas públicas. Não querendo prolongar esta temática, a distinção entre instituto público e empresa pública baseia-se na distinção entre setor público administrativo e o setor público empresarial, de onde fazem parte os institutos públicos e as empresas públicas, respetivamente.
Estas entidades e serviços nem sempre se encontram num nível máximo de autonomia em relação ao Estado (como é o caso das empresas públicas). Podem encontrar-se num nível intermédio, quando a sua atividade engloba funções de autoridade derivadas de poderes de fiscalização e coordenação (por exemplo os organismos de coordenação económica), ou até num nível mínimo quando a personalidade jurídica e autonomia (tanto administrativa como financeira) constituem uma mera aparência (por exemplo as direções gerais dos ministérios).

Bibliografia:
AMARAL, Diogo Freitas do; Curso de Direito Administrativo, vol. I, 4ª edição, Coimbra, 2015

Inês Gonçalves, nº28251




                                        Os tipos de Administração Pública: um resumo



À semelhança do meu texto anterior escrito para o blog, este trabalho destina-se a ser um pequeno instrumento de ajuda ao estudo. Neste texto em concreto, pretendo fazer um pequeno dos vários tipos de Administração Pública que encontramos no universo do Direito Administrativo, não tendo quaisquer pretensões a fazer com seja algo mais do que o objectivo a que aqui me proponho.  Aliás, devido à extensão do tema, seria impossível fazer um trabalho mais aprofundado, pois tal exigiria imenso tempo para escrever um texto minimamente decente, tendo em conta os padrões de exigência do ensino universitário. Como tal, limito-me a enunciar os tipos de Administração Pública que podemos encontrar no Direito Administrativo, centrando-me na realidade portuguesa.
Aproveito para expor a bibliografia utilizada, avançando depois para o texto propriamente dito. Socorri-me das seguintes obras para escrever este texto:
. DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, volume I, parte I “ A Organização Administrativa”, Capítulo I “ A Organização Administrativa Portuguesa”, págs. 219 a 744
. PAULO OTERO, Manuel de Direito Administrativo, vol.I, 2013, págs. 202 a 222.
Sem mais demoras, avancemos para a matéria.

                                                     
                                                         Os tipos de Administração Pública
O Estado é o substrato da Administração Pública, é uma pessoa colectiva pública, impassível de se confundir com os órgãos político-administrativos, com os seus cidadãos, e com os titulares desses órgãos.(1). Interessa-nos a função administrativa do Estado, que tem de estar sempre sujeita às leis e à Constituição.
Seguido o esquema utilizado por PAULO OTERO (2), este considera haver cinco “principais critérios de referência:”
- O Direito Regulador da Administração;
- A Organização da Administração Pública;
- A actividade desenvolvida pela Administração Pública, que se centrada com as “tarefas materiais” prosseguidas pela Administração;
- O procedimento da Administração Pública; que se centra no processo de aplicação e execução das decisões dos seus órgãos;
- Os efeitos produzidos pela actividade Administrativa.
FREITAS DO AMARAL (3), por seu turno, tem uma classifica mais exígua de tipos de Administração Pública, dividindo esta em sobretudo Administração Central e Administração Local ou Administração directa e indirecta.
Entendemos que a organização de PAULO OTERO é a mais adequada, tendo em conta que a Administração Pública não é só composta pelos seus órgãos. Considero o esquema quadripartido de FREITAS DO AMARAL demasiado limitado, pois não reflecte a realidade cada vez mais complexa da Administração Pública, limitando-se a uma classificação demasiadamente orgânica. Porém, tal não invalida que se não se deva consultar o seu manual, que faz um “desenho” excelente dos órgãos da Administração Pública em Portugal. Mas não sendo o tema deste trabalho a orgânica da Administração portuguesa, seguiremos o esquema de PAULO OTERO.
Seguindo o elenco dos cinco critérios de referência desenhado por OTERO e acima enunciados, comecemos pelo Direito Regulador e seus tipos.
Direito regulador e tipos de Administração Pública
Esta classificação de acordo com o Direito Regulador segue a “adesão ou conformação administrativa ao ordenamento jurídico que a visa disciplinar” (4) Ou seja, este critério divide a Administração tendo em conta o seu respeito pelas normas que regem o Direito Administrativo.
Dentro deste critério de Direito Regulador, temos seis tipos:
- Administração de Direito Público e Administração de Direito Privado. – É uma dicotomia fácil de entender. Considera-se que há “Administração de Direito Público” quando esta segue as regras de Direito Público e está dotada de poderes de autoridade; há Administração de Direito Privado quando esta segue as regras e princípios do Direito Privado, submetendo-se ao princípio da igualdade e desprovida de poderes de autoridade.
-  Administração Vinculada e Administração discricionária – a Administração vinculada pauta a sua acção sobretudo pelo enunciado nas regras jurídicas, tendo pouca liberdade discricionária para tomar decisões autónomas que não estejam enunciadas na lei. Ao invés da primeira, a Administração discricionária, estando na mesma vinculada às regras jurídicas, tem mais autonomia para  executar decisões sem interferência dos outros órgãos do Estado, sendo essa autonomia conferida pelo legislador. Note-se que a  Administração discricionária continua a estar sob o primado da lei, mas esta confere-lhe maior autonomia do que a encontrada numa Administração vinculada.
Administração fundada na Constituição e Administração fundada na legalidade – o primeiro tipo de Administração baseia-se sobretudo em normas constitucionais para encontrar os princípios da sua acção, como acontece na Constituição portuguesa, no artigo 18, nº1 ( Força Jurídica). A Administração fundada na legalidade encontra os seus princípios fundamentais em normas não-constitucionais.
Administração de excepção e Administração de normalidade – a Administração de Excepção é que aquela que actua durante momentos excepcionais – como o estado de sítio ou de emergência ( artigo 138 da Constituição) e que pode aplicar normas extraordinárias  - a Administração de normalidade é a que funciona sob as normais regras de legalidade.
Administração formal e informal – Entende-se por Administração formal aquela que tem toda a sua acção executa dentro do quadro procedimental e legal que é dado pelas leis. A Administração informal desenvolve a sua acção com maior discricionariedade, utilizando instrumentos que a permitam agir com maior agilidade, instrumentos esses que não são regulados normativamente.  Há que ter em atenção, contudo, que tal acontece “ sem que se verifique qualquer situação de estado de necessidade ou exista habilitação para um agir contra legem; a Administração informal (…) age praeter legem.” (5)  Ou seja, a Administração não age à margem da lei e dos princípios de Direito Administrativo, nem pode chocar contra estes.
Administração oficial e não-oficial  - a Administração oficial é a representação de um bom sistema administrativo, estando bem delineados e clarificados na lei os limites da Administração e o seus procedimentos, em suma, o que pode ou não fazer. A Administração não oficial é já uma perversão do Direito Administrativo, agindo sem supervisão e sem ter em conta as normas reguladoras, tornando-se num “monstro” que tudo consome e sendo violenta na prossecução dos seus fins, além de não ser uma administração prestadora de serviços.

2. Tipos de Administração segundo a sua organização.
Sendo o Governo o órgão executivo do país, é também o órgão principal da Administração Pública, tendo a sua legitimidade reforçada em relação aos demais órgãos da Administração pelo facto de ser um órgão de soberania, além de ser indubitavelmente o órgão principal da Administração e de também ter uma legitimidade democrática indirecta, proveniente da sua aceitação e fiscalização pelo órgão legislativo nacional, eleito por todos os portugueses, neste caso a Assembleia da República.
Administração territorial, associativa e institucional – A Administração territorial representa os interesses dos habitantes de um território, seja este o nacional, regional ( no caso das Regiões Autónomas) ou das autarquias locais.
A Administração associativa tem o sue substrato em pessoas colectivas, públicas ou privadas que procuram satisfazer o interesse público. Exemplo de Administração associativa, no caso de Direito Público, são as Associações Públicas.(6) No caso de Direito Privado, temos as Pessoas Colectivas de Utilidade Pública.(7)
A Administração institucional baseia-se numa instituição pública com poderes para prosseguir  interesses públicos específicos – o exemplo mais claro são os Institutos Públicos.(8)
Administração central e periférica – uma distinção de fácil compreensão: a administração central tem o seu âmbito de actuação por todo o território nacional enquanto que a Administração periférica circunscreve-se a um território limitado ( distritos, regiões, por ex.)
Administração geral e corporativa – a Administração geral tem como finalidade servir os interesses de todos os cidadãos; a Administração corporativa serve os interesses públicos de um grupo específico, como os advogados, médicos, engenheiros, etc.
Administração dependente e independente  - a Administração dependente é aquela que está submetida a poderes de fiscalização ou intervenção provenientes de outros órgãos da Administração Pública – ex: Direcções-Gerais em relação aos Ministérios. Na Administração independente é o caso oposto, estando estes órgãos vinculados somente à lei e não a outro órgão administrativo – é o caso do Provedor de Justiça, Procuradoria-Geral da República, etc.
Administração sob forma pública e sob forma privada – a Administração sob forma pública é prosseguida por entidades públicas sob a égide do Direito Público, como os municípios. A Administração sob forma privada prossegue os interesses públicos mas sob o Direito Privado – ex: Instituições particulares de interesse público.(9)

Existe também a distinção entre Administração do Estado, administração infraestadual e supra-estadual. A Administração do Estado é organizada pelo Estado central, a infraestadual desenrola-se sobre órgãos que estão submetidos à autoridade central e a supra-estadual refere-se aos órgãos de Administração internacional, como são os órgãos administrativos da União Europeia.


3. Tipos de Administração pública segundo a actividade desenvolvida

Administração substantiva e  administração processual – a Administração substantiva é aquela que, sob a “vigilância” da disciplina do Direito, regula de forma directa e imediata as situações jurídicas da vida administrativa, “ definindo posições jurídicas dos administrados perante a Administração, ou desta perante aqueles”.(10)
Enquanto isso a administração processual desenvolve a sua actividade como parte litigante em processos judiciais ou arbitrais, também praticando actos processuais. A Administração processual executa as suas decisões sobretudo por  via judiciária.
Administração neutral e administração intervencionista
A Administração neutral é aquele que garante a liberdade, a segurança e a propriedade, não intervindo directamente numa acção directa para melhorar o bem estar social ou as condições de vida.
A Administração intervencionista, pelo contrário, é aquela que trabalha para consagrar direitos básicos sociais aos administrados( como os direitos à saúde, à educação, ou à habitação, consagrados na Constituição) intervindo directa ou indirectamente na economia, colaborando com privados ou fazendo-o por si própria, com organizações públicas.

Administração produtora e reguladora – a primeira presta directamente os serviços que considera necessários para a satisfação de necessidades colectivas, enquanto que a Administração reguladora visa regular o funcionamento do mercado de forma a beneficiar os cidadãos. A Administração Pública moderna, inclusivamente em Portugal, é simultaneamente produtora ( serviços de saneamento, hospitais, escolas…) e reguladora ( regulação da actividade financeira e bancária, definição de regras na participação de privados na Saúde, etc.)


Administração burocrática e empresarial – a Administração burocrática segue uma actividade sem fins lucrativos e tem um modelo hierárquico e de funcionamento interno quase estático, baseando-se no conhecimento técnico dos seus funcionários. A Administração empresarial funciona sobre uma lógica de mercado, tem como objectivo o lucro e segue critérios económicos, podendo ser organizada  segundo a égide do Direito Público ( sector empresarial público) ou do Direito Privado. Exemplos institucionais de administração empresarial são a Caixa Geral de Depósitos, Estradas de Portugal, entre outras.
Administração de sacrífico e de prestação – a primeira é uma Administração agressiva, que visa satisfazer o interesse público com actos impositivos, limitando a liberdade dos administrados, obrigando-os a fazer prestações à Administração ( que têm de estar previstas na lei, como é evidente.). Os exemplos mais flagrantes são a Administração tributária, nomeadamente pela cobrança de impostos, ou a Administração policial.
A Administração de prestação não é coactiva e visa a produção de bens e prestação de serviços considerados essenciais para a melhoria das condições de vida dos cidadãos.
Administração de ordenação e de infra-estruturas –
A Administração de ordenação visa garantir a ordem colectiva, assumindo a sua acção numa lógica de prevenção de riscos para a segurança dos particulares, intervindo na liberdade destes. A Administração de ordenação tem vários graus de acção: por exemplo, em maior grau temos a protecção dos cidadãos de actos terroristas, em menor grau temos a fiscalização da qualidade dos produtos alimentares.
A administração de infra-estruturas, numa óptica intervencionista na sociedade, desenvolve “ uma actuação conformadora ou transformadora, numa visão renovadora do bem estar. (…) recorrendo à planificação e alicerçada num programa de políticas públicas no sector administrativo, mostrando-se susceptível de produzir decisões dotadas de efeitos reflexos numa pluralidade de pessoas.”(11)
Esta dicotomia está directamente relacionada com a dicotomia Administração de estratégica e de transformação: a administração de estratégica segue uma visão política da actividade administrativa, projectando soluções para a persecução das necessidades das pessoas – a Administração de transformação procura, utilizando meios mais técnicos, implementar o que a Administração estratégica tinha planeado. Os exemplo mais evidente destes dois tipos de Administração é a construção de grandes infra-estruturas, como aeroportos, estradas, caminhos de ferro… ou alterações legislativas de fundo ( ex: alteração dos estatutos universitários)

3. Tipos de Administração pelo procedimento adoptado
Administração unilateral e bilateral
A Administração unilateral é uma administração agressiva, que actua sem o consentimento das vontades alheias na constituição da decisão, executando as suas decisões unilateralmente, mas sempre sob o princípio da legalidade. O melhor exemplo de execução unilateral são os actos administrativos.
A Administração bilateral, pelo contrário, prefere que exista a participação no caso concreto das partes interessadas, ouvindo as opiniões destas e decidindo baseando-se num acordo de vontades, que pode ter variadas denominações. O exemplo mais frequente é o dos contratos entre Administração Pública e privados ( ex: concessão, contrato de empreitada de obras públicas.
Esta dicotomia está directamente relacionada com outras duas dicotomias: a de Administração impositiva vs Administração concertada(12), (a primeira impõe unilateralmente a sua vontade aos administrados e a segunda segue uma prespectiva mais democrática e inclusiva de administração), assim como a dicotomia Administração de subordinação vs Administração paritária (13) – a primeira obriga o destinatário das decisões a acatar a decisão da Administração, enquanto que a segunda consagra uma igualdade jurídica entre o cidadão e o Estado, o último reconhecendo direitos e oposições jurídicas activas ao primeiro.

Administração executiva e judiciária (14) – como anteriormente estudado na cadeira, a primeira tem como instrumento preferido a execução prévia das suas decisões, tendo uma “autotutela executiva”. As suas decisões podem ser impugnadas judicialmente, mas somente após a sua aplicação. A Administração judiciária não tem poder de autotutela e executa as suas decisões com o assentimento dos tribunais, se não existir consentimento entre Administração e administrado.
Administração transparente e opaca – como indica o título, a primeira é a que comunica as suas decisões e os seus regulamentos, assim como os seus procedimentos, de forma transparente aos cidadãos, como corolário de um Estado de Direito Democrático. A segunda “fecha-se em si mesma”, impondo “ uma distância de autoridade entre os seus serviços, titulares de uma postura de supremacia aos particulares, reduzidos à qualidade de súbditos ou meros administrados.” (15)

Os tipos de Administração pública segundo os efeitos produzidos

Administração de assistência e agressiva: - a Administração de assistência é aquela que confere posições jurídicas favoráveis aos seus destinatários, “ ampliando as já existentes ou removendo restrições  e quaisquer limitações ao exercício de posições jurídicas activas tituladas.” (16)
A Administração agressiva é aquela que produz efeitos que prejudicam as posições jurídicas activas dos administrados e reforçam as posições jurídicas passivas. Exemplos materiais destes efeitos são os aumentos de impostos ou a expropriação de bens.
Administração constitutiva e declarativa: -o primeiro tipo de Administração incumbe-se de uma função transformadora da sociedade, alterando a ordem jurídica ou situações jurídicas individuais. Essas alterações, segundo o ponto de vista do cidadão, podem ser tanto favoráveis como desfavoráveis.
A Administração declarativa não produz alterações na ordem jurídica, limitando-se a reportar realidades e factos. Exemplos são a emissão de registos civis ou certidões de habilitações académicas. (17)
Administração decisória e consultiva – a Administração decisória visa “dar resposta imediata aos interesses públicos a seu cargo”(18). A sua acção interfere directamente na esfera jurídica dos cidadãos e é caracterizada por decisões definitivas, elaborando regulamentos ou definindo o Direito aplicável ao caso concreto.
A Administração consultiva limita-se a dar um apoio técnico à Administração decisória, emitindo opiniões que visam aconselhar a Administração decisória para que esta tome a melhor decisão. Os instrumentos de acção preferidos da Administração consultiva são os pareceres e recomendações.
Administração preventiva e repressiva – estes dois tipos de Administração inserem-se numa perspectiva de prevenção de riscos ou de eliminação de riscos que ponham em causa o bom funcionamento da sociedade. Como o nome indica, a primeira prefere agir impedindo a produção de efeitos prejudiciais à sociedade, baseando-se em elementos que indiquem que tal possa vir a acontecer. Os exemplos mais ilustrativos são, entre muitos outros: a elaboração de planos contra catástrofes naturais, a vigilância de pessoas ou grupos suspeitos de crimes ou a limpeza das matas para evitar incêndios. (19)
A Administração repressiva destina-se a eliminar ameaças ( ou minorá-las, na medida do possível) que estão em curso ou que já foram consumadas, assim como de sancionar quaisquer possíveis responsáveis humanas. Exemplos são a detenção de criminosos, a instauração de processos disciplinares ou o auxílio a vítimas de catástrofes naturais.
Administração externa e interna – o âmbito destes dois tipos de administração é de fácil compreensão: a primeira produz efeitos fora da dos próprios órgãos da Administração Pública, influenciando a maioria ou a generalidade dos cidadãos. Os efeitos da Administração interna, pelo contrário, produzem-se somente no âmbito dos órgãos internos desta. Ex: despachos de ministros, regulamentos internos de instituições públicas, despachos do Director da Faculdade de Direito.
Administração nacional e transnacional – a Administração nacional é aquela cujas decisões têm eficácia dentro do território nacional, independentemente da nacionalidade do destinatário residente dentro de fronteiras nacionais. A Administração transnacional já é eficaz além do território nacional, exigindo que a Administração nacional colabore com Administrações de outros Estados para satisfazer interesses públicos que são eles também transaccionais. Um exemplo bastante ilustrativo é a a elaboração de acordos internacionais pelo Estado português com outros Estados ou organizações internacionais que regulam a circulação de pessoas, mercadorias e capitais.

(1)   – Freitas do Amaral, Curso…, págs 219 a 223
(2)   Paulo Otero, Manual…, pág. 202
(3)   Freitas do Amara, curso, pág.226 e seguintes
(4)   Paulo Otero, idem
(5)   Paulo Otero, Manual.., pág 205
(6)   Freitas do Amaral, pág 423 e seguintes
(7)   Freitas do Amaral, Curso,… pág 735 e seguintes
(8)   Freitas do Amaral, Curso, … págs. 361 e seguintes
(9)   Freitas do Amaral, Curso,… pág. 715 e seguintes
(10)                      Paulo Otero, Manual…, Pág. 211
(11)                      Idem, pág. 215
(12)                      Idem, págs 218 e 219
(13)                      Idem, pág.219 e 220
(14)                      Sobre a Administração executiva e a Administração judiciária, ver Freitas do Amaral, Curso…, págs. 99 a 120.
(15)                      Paulo Otero, Manual…, págs 221 e 222.
(16)                      Idem, pág. 222
(17)                      Idem, pág 223
(18)                      Idem ibidem
(19)                      Idem ibidem


Ricardo Mendonça