sexta-feira, 19 de maio de 2017

Comissão de Representantes dos Moradores de Carnitas


Tendo o caso sido iniciado pela nossa indignação relativamente à actuação da Câmara Municipal de Listejo e da EMULTA, vimos, através de uma comissão de representantes dos moradores de Carnitas, defender os nossos direitos enquanto residentes desta freguesia e apoiar a Junta de Freguesia de Carnitas na contestação do estacionamento tarifado no centro histórico e na apresentação de uma providência cautelar nos tribunais administrativos para reagir à actuação do Presidente da Câmara e da Presidente do Conselho de Administração da EMULTA.
Na noite do primeiro de Abril, procedemos à retirada dos parquímetros, instalados pela empresa Municipal EMULTA, na zona do centro histórico da autarquia. Compete esclarecer, desde já, que não se tratou de um mero acto de vandalismo mas sim de uma resposta à conduta abusiva da Administração Pública.
Relembramos que o fim último da atuação administrativa é o interesse público: assim o dita o artigo 4.º do Código do Procedimento Administrativo e ainda o artigo 266.º, n.º1, da Constituição da República Portuguesa, que juntos vinculam a administração a um dever de prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. Neste sentido, não compete à administração decidir o que é melhor para nós, pois encontra-se vinculada a prosseguir o interesse público tal como primariamente definido pela Constituição e objeto de concretização pela lei.
Se por um lado, admitimos a importância da promoção das condições de mobilidade em qualquer parte da cidade, por outro, atribuímos prioridade a questões como a requalificação do centro histórico e a construção de parques de estacionamento para a zona em questão. Neste sentido, consideramos que o interesse público deve ser condicionado pelas características próprias de cada circunscrição territorial. Se num plano abstrato o ordenamento do território, no seu todo, é uma questão importantíssima, num plano concreto e prático, que como moradores da cidade Listejo conhecemos e vivenciamos diariamente, sabemos que existem questões prioritárias para as quais devem ser canalizados os recursos financeiros e humanos disponíveis.
Deste modo, consideramos que mais “importante” do que uma gestão ordenada da nossa humilde freguesia é a promoção da mesma numa zona onde a afluência de pessoas é muito maior, sendo fulcral uma maior organização.
Consequentemente, na nossa condição de cidadãos, manifestámo-nos confrontando a Administração com aquilo com que no mesmo dia nos tinha ela confrontado: uma ação fundada na autoridade e desprovida de negociação anterior. 
A afetação do nosso cómodo acesso à habitação, e da nossa disposição da via pública para efeito de estacionamento, constituiu um interesse a defender. Não permitindo a defesa, a Administração ofendeu-o. E com ele, a nós, moradores e sujeitos de direito de uma freguesia, também sujeita de direitos, como o Estado de Direito, a Lei e a Constituição o quiseram. Desta forma, o que fizemos foi reagir diretamente contra a omissão de um nosso direito fundamental e requisito formal da validade do procedimento administrativo, que é o direito de audiência, que vê a sua consagração constitucional pelo artigo 267.º, n.º5, da Constituição da República Portuguesa, e regulação nos artigos 100.º e seguintes do Código de Procedimento Administrativo. 
Em jeito de acrescento, este código confere, ainda, pelo seu artigo 11.º, o direito à estreita colaboração entre a Administração e os particulares, que devem ser por ela informados e esclarecidos, da mesma forma que a própria está vinculada a aceitar sugestões, e mesmo incentivá-las.
Como o Professor VASCO PEREIRA DA SILVA o compreende, os moradores deveriam não apenas ter sido chamados a pronunciar-se acerca da questão a decidir, como também ter sido informados do sentido provável da decisão e das razões justificativas dessa escolha. Isto porque, como advoga o mesmo Autor, embora se trate de um procedimento em massa, com um grande número de destinatários do ato, não é por esse número que deixámos de ser pessoal e individualizadamente atingidos, de maneira que se justificava a existência de meios de proteção jurídica subjetiva anteriores à decisão.
Só com a nossa audiência, como a lei impera, se cumpririam os objetivos constitucionais da exigência da participação dos particulares na formação das decisões que lhes dizem respeito. 
Omitindo este dever, o ato da Administração redunda, ainda na esteira do ilustre, na nulidade, porque, como alegámos, houve a agressão de um direito fundamental. A Constituição trata os indivíduos como sujeitos de direito na relações administrativas, e reconhece-nos expressamente direitos subjetivos perante a Administração; conjugadamente, o status processualis do cidadão do século XXI trouxe à letra uma verdadeira cláusula aberta de direitos fundamentais, devido à presunção, num Estado de Direito, de um direito subjetivo para cada norma que estabelece um dever à Administração. Estas premissas perfazem a teoria da norma de protecção, do ilustre, que invocamos em nossa defesa.
Para demais, o nosso direito de procedimento, que é para o Professor FREITAS DO AMARAL a terceira fase das quatro que constituem o procedimento administrativo, é uma manifestação do princípio da dignidade da pessoa humana nas relações jurídicas administrativas, que não pode nunca ser omitido. Por esta razão, urge garantir a dignidade da pessoa humana não apenas através do Estado-Administração, mas também como face dele.

Por outro lado, o artigo 237.º da Constituição da República Portuguesa consagra o princípio da descentralização administrativa, o que exige que o exercício da função administrativa seja executado por diversas pessoas coletivas, além do “Estado-administração”, só assim se pode atingir uma correta, eficiente e célere atuação administrativa, uma correta especialização e uma correta repartição do poder que evita o seu abuso.
Tal como foi anteriormente referido, a Administração deve prosseguir exclusivamente o interesse público, prestando serviços imparciais, qualificados e eficientes, deve pensar nos cidadãos e no que mais os beneficia, é isso que deve mover a atuação administrativa bem como a sua organização
Ora, quem melhor que a nossa Junta de Freguesia, que presa uma relação de proximidade com todos nós, habitantes de Carnitas, desde logo pela conduta excecional do Sr. Presidente da Junta, Fábio Sem Terra, para perceber as nossas necessidades e carências? Ninguém. Parece-nos inadmissível a atuação levada a cabo pela Câmara Municipal de Lisotejo, que sustentada apenas pela preocupação com o aumento dos lucros, não cumpriu as deliberações aprovadas em assembleia, como a requalificação do centro histórico e a construção de parques de estacionamento que possamos utilizar diariamente. 
Ora, a descentralização administrativa não se limita à sua consagração constitucional, devendo ser posta em prática, já que só assim se atingem os objetivos de forma eficiente. Pelo contrário, a atuação da Câmara Municipal está a funcionar como entrave à prossecução dos interesses de todos nós que habitamos em Carnitas, encontrando-nos perante um ato despótico de sobreposição de interesses económicos aos interesses da população de Carnitas.
Cumpre ainda refererir que as freguesias são autarquias locais e, nessa media, inserem-se na administração autónoma. Em conformidade, tal como o Professor FREITAS DO AMARAL refere, a administração autónoma é aquela que prossegue interesses públicos próprios das pessoas que a constituem e por isso se dirige a si mesma, definindo com independência a orientação das suas atividades, sem sujeição a hierarquia ou superintendência do Governo.
Neste sentido, na visão do mesmo Autor, as freguesias são as autarquias locais que, dentro do território municipal, visam a prossecução de interesses próprios da população residente em cada circunscrição paroquial. De entre os três planos que compõem as suas atribuições, encontramos o plano económico, onde cabe a esta vertente de administração autónoma a jurisdição dos bens que compõem a circunscrição em causa, dos quais parques e zonas de estacionamento, bem como a promoção de obras públicas e a manutenção das mesmas, integrando o artigo 7.º, n.º 2, alínea j) da Lei das Autarquias Locais.
O n.º 1 do artigo anterior acrescenta que o mesmo será feito em “articulação com o município”. Note-se que esta “articulação” apenas implica uma ideia de coordenação e não de subordinação. Vejamos, neste ponto, a clara distinção que o Professor FREITAS DO AMARAL elabora relativamente às circunscrições onde deve actuar cada autarquia local. Neste sentido, para este Autor, o município é a autarquia local que visa a prossecução de interesses próprios da população residente na circunscrição concelhia. Ao fazer referência aos interesses da população residente na “circunscrição concelhia”, delimita-se o âmbito do município, distinguindo-o da freguesia, que visa a prossecução de interesses próprios de outra população, definida em função da residência em circunscrições de área mais restrita que a do município. Nesta medida, há uma clara fronteira entre estas autarquias locais, cabendo à freguesia a prossecução do interesse paroquial.
O artigo 131.º da Lei das Autarquias Locais permite, ainda, que os municípios deleguem competências nas freguesias, mediante a celebração de um contrato inter-administrativo, em todos os domínios dos interesses próprios das populações respetivas. Este contrato de delegação de competências é celebrado entre a Câmara Municipal e a Junta de Freguesia, carecendo de autorização, por um lado, da Assembleia Municipal (artigo 25.º, n.º1, alínea k) da Lei das Autarquias Locais) e, por outro, da Assembleia da Freguesia (artigo 9.º, n.º1, alínea g), da Lei das Autarquias Locais).
Todavia, independentemente da celebração de qualquer contrato de delegação de competências, a lei considera, no artigo 132.º da Lei das Autarquias Locais, que estão delegadas nas juntas de freguesia, de forma tácita, um conjunto significativo de competências das câmaras municipais, nomeadamente, na alínea a), do nº2, do artigo supramencionado, a ocupação e utilização da via pública.
Assim, a requalificação da zona histórica e a construção de parques de estacionamento adequados não foi feita, mas não obsteve a implementação de parquímetros – mais  do que reconfigurar um contra-senso deste órgão, não coaduna com o Princípio da Boa-Fé (art. 10.º), que, no seu artigo 2.º, imprime o respeito pelos corolários da tutela da confiança (da contraparte) e primazia da materialidade subjacente (do acto).
Note-se que o Municipio se sobrepôs, assim, não só à Junta como ao próprio princípio democrático. É à população que cumpre eleger quem são os seus representantes. Nesta medida, considerar a freguesia incompetente para decidir em matérias de interesse paroquial é esvaziar o conteúdo desta autarquia local, pois é exactamente a sua proximidade relativamente aos fregueses que dita a necessidade da sua existência. 
A Administração Pública portuguesa, e todos os seus órgãos e entidades, são, então, obrigadas a colaborar com os particulares, como referido no artigo 11.º do Código de Procedimento Administrativo, bem como a permitir a participação destes na formação das decisões que lhes digam respeito, como referido, mediante o disposto no artigo 12.º do mesmo Código.  Ainda, mediante o art 121.º do Código de Procedimento Administrativo, que advoga o direito de audiência prévia, os interessados, neste caso, nós,  habitantes da freguesia, possuem o direito de ser ouvidos no procedimento administrativo, antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta. Temos portanto o direito de nos pronunciarmos sobre todas as questões relativas à instalação destes parquímetros e ainda de requerer todas as diligências complementares. Como tal, entendemos que a Administração Pública, ao não nos ter ouvido e ao não ter tido em conta os nossos interesses, não respeitou o seu próprio objetivo que é o da satisfação regular e contínua do destino coletivo. Entendemos que o interesse público, não foi tido em conta, pelo que este ato deverá ser anulável, na medida em que viola os princípios de participação no procedimento e de audiência prévia.
O procedimento adiministrativo é resultado do culminar de uma fase da iniciativa, que já sabemos ser oficiosa ou por iniciativa dos interessados, seguida de uma fase da instrução, que tem uma parte importantíssima, que é a da audiência dos interessados. Esta vem, sobretudo, regulada na parte especial. Assim, nos regulamentos prevê-se a audiência dos interessados no artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo, ou, quando o número de interessados o justifique, decorre do n.º3, alinea c) do mesmo artigo, a possibilidade de consulta pública. Por outro lado, no caso do procedimento do ato administrativo, os artigos 121.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, prevêem o direito de audiência dos interessados. 
No fundo, após a realização de diligências instrutórias e da (eventual) produção de prova pelo interessado, é realizado um projeto de decisão, seja o projeto de emissão de um regulamento, seja o projeto de emissão de um ato, que é submetido a audiência dos interessados. Note-se a importância deste mecanismo quando, por exemplo, em termos de atos administrativos, ainda se admite que, após a audiência dos interessados, a Administração possa, nos termos do artigo 125.º do Código do Procedimento Administrativo, efectuar diligências complementares.
Ora, neste caso, a Câmara Municipal, numa atitude prepotente, não ouviu as legítimas preocupações dos nossos fregueses, tendo avançado com a instalação dos parquímetros independentemente das queixas destes. Neste contexto, resulta do artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo, conjugado com o artigo 268.º da nossa Constituição, que a Câmara Municipal teria o dever de notificar os habitantes da freguesia, tal como de informar os mesmos sobre o andamento deste processo que nos dizia diretamente respeito.
Ressalve-se, que mesmo que a Câmara Municipal fosse competente para tomar esta decisão, estaria obrigada a fundamentá-la, pois esta afecta interesses legalmente protegidos, como diz o artigo 152.º, n.º1, alínea a) do Código do Procedimento Administrativo.
Finalmente, recordamos ainda o princípio da administração aberta, enquadrado no artigo 17.º do Código do Processo Administrativo, sendo também consagrado na Constituição, do qual resulta que perante uma informação considerada do interesse público, que adiantamos, desde já, ser o caso, na medida em que se trata da tomada de uma decisão administrativa e de dar conhecer os estudos em que assentou essa decisão, esta deve tornar-se pública.
Concluindo, acreditamos que o ato que ordenou a colocação dos parquímetros padece de vício de forma quanto à não observância de formalidades anteriores ao ato, uma vez que não foi concedida audiência aos interessados no procedimento, assim como de vício de violação da lei por, de qualquer forma, não ter havido fundamentação do mesmo, como ordena o artigo 152.º, nº1, alínea a) do Código do Procedimento Administrativo, além de violação do princípio de colaboração com os particulares, referido no artigo 11.º do mesmo Código, sendo que o Professor FREITAS DO AMARAL, enuncia a violação de princípios gerais como conteúdo de violação da lei.
Pelas razões aqui enunciadas, cremos que o ato é anulável nos termos do artigo 163.º, nº1 do Código do Procedimento Administrativo.

Por tudo aquilo que aqui foi exposto, nós, enquanto habitantes da freguesia de Carnitas, queremos ser ouvidos, de forma a defender e promover os nossos interesses comuns e, como tal, vamos fazê-lo juntos, dirigindo-nos à assembleia da nossa freguesia, tendo em conta que o artigo 26.º, nº3, da Constituição da Républica Portuguesa permite que possamos formar uma organização para intensificarmos a nossa participação na vida administrativa local, visto que tal não foi tido em conta quando decidiram instalar os parquímetros sem sequer nos ouvirem. Assim, o artigo 265.º,  da nossa Constituição permite que façamos uma petição relativamente a assuntos administrativos que sejam do nosso interesse. Neste sentido, nomeamos o Presidente da Junta de Freguesia como nosso representante, pois queremos ver os nossos direitos defendidos através da contestação desta instalação.



Trabalho realizado por:

- Beatriz Lourenço
- Beatriz Serrano
- Beatriz Sousa
- Carla Costa
- Érica Correia
- Margarida Bento
- Ricardo Mendonça

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